segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Espólio pode ser caracterizado como empregador doméstico provisório


no JusBrasil

Extraído de: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região  -  25 de Fevereiro de 2011 
O espólio pode ser empregador doméstico? No entender do juiz substituto Daniel Gomide Souza, existem situações em que o espólio pode, sim, ser caracterizado como empregador doméstico, desde que a prestação de serviços se mantenha, nos mesmos moldes, em face da mesma entidade familiar e que não haja intenção de obter lucro. O magistrado trouxe a sua resposta para esse questionamento depois de analisar uma ação peculiar, que tramitou perante a 17ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Na situação em foco, o vigia continuou trabalhando na residência depois do falecimento de seus patrões. Como uma pessoa estranha à família se responsabilizou pela administração patrimonial, o vigia insistiu na tese de que seu trabalho não poderia ser enquadrado como doméstico.
Espólio é o conjunto de bens, direitos, rendimentos e obrigações deixados pela pessoa falecida, os quais serão partilhados no inventário entre os herdeiros ou legatários. De acordo com a argumentação do trabalhador, o espólio não poderia ser empregador doméstico. O vigia entende que deve ser enquadrado como empregado comum, com todos os direitos relativos à essa qualidade, como, por exemplo, depósitos do FGTS e horas extras. Entretanto, em sua sentença, o julgador trouxe um posicionamento diferente acerca da matéria. Ele lembra que existe, no Direito do Trabalho, o princípio da continuidade do vínculo, que deve ser aplicado ao caso, tendo em vista que a morte do empregador doméstico não extingue a relação de emprego, caso a prestação de serviços prossiga nos mesmos moldes anteriores.
Nesse sentido, o magistrado reforça a sua tese de que o espólio pode ser, provisoriamente, empregador doméstico, uma vez que, no caso em questão, não houve alteração substancial do contrato de emprego, pois o trabalhador continuou prestando mesmo tipo de serviço para o mesmo núcleo familiar. Em outras palavras, apesar de se tratar de uma situação jurídica atípica, a essência do contrato de trabalho permaneceu inalterada. "Aqui, a meu ver, é irrelevante a figura dos entes familiares - marido e esposa, ascendentes ou descendentes - a sucessão pode se operar perfeitamente, pois não há solução de continuidade", concluiu o juiz sentenciante, condenando o espólio ao pagamento das parcelas típicas do vínculo de emprego doméstico, correspondentes ao período de 1997 a 2007, já que, a partir de 2007, o reclamante passou a trabalhar como empregado urbano. O TRT mineiro confirmou a sentença.
nº 01013-2009-017-03-00-8 )

Justiça do Trabalho adota novo modelo de cobrança


EXECUÇÃO DE DÍVIDA

no Conjur


Cerca de 2,3 milhões de processos aguardam execução na Justiça do Trabalho. A média nacional da taxa de congestionamento da execução é de 67,9%, e de 72,7% se forem considerados os processos arquivados sem desfecho. Para diminuir esse número, as cobranças de execuções trabalhistas vão seguir o modelo de cobrança de títulos inscritos em cartórios de protesto e serviços de proteção ao crédito. As informações são da Agência Brasil.
Segundo o corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Carlos Alberto de Paula, essa demora atinge todas as regiões do país. E é um problema porque “a essência do processo é a fase de execução, pois, senão, fica uma situação de ganhou, mas não levou. A decisão não pode ser um anúncio de direito, tem que ser realidade”. O estado que lidera o ranking do congestionamento é a Bahia (85,8%), seguida pelo Ceará (85,1%) e pelo Rio de Janeiro (82,4%). Os menos congestionados são Sergipe (36,2%) e São Paulo (51,1%), que também é onde tramitam mais execuções no país, quase 270 mil.
Segundo o juiz Marcos Fava, que participou de um grupo formado, no ano passado, pela Corregedoria do Tribunal Superior do Trabalho para estudar a demora das execuções, “o transtorno das pessoas com a ineficácia de uma decisão da Justiça do Trabalho é muito grande. Para muita gente, não levar o que ganhou na Justiça é o mesmo que passar fome. Outro problema grave é que muitos processos trabalhistas lidam com a saúde da pessoa, e isso não pode esperar”.
Muitas vezes, a variação entre as taxas de congestionamento pode ser encontrada em varas diferentes da mesma cidade, como é o caso de São Paulo, cuja 31ª Vara do Trabalho tem a maior quantidade de sentenças não executadas do país (9.219), e cuja 42ª Vara é uma das melhores do país com apenas quatro processos para executar. 
Mudança na execução
O Colégio de Presidentes e Corregedores de Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor) aprovou as sugestões apresentadas pela comissão do TST e determinou que as cobranças de execuções trabalhistas sigam o modelo de cobrança de títulos inscritos em cartórios de protesto e serviços de proteção ao crédito. O modelo já está sendo aplicado em alguns tribunais do país, como o de Campinas, de São Paulo e do Distrito Federal/Tocantins (10ª Região), e deve ser implantado em todo o Brasil. 
Com a mudança, espera-se que o acervo de 2,3 milhões de sentenças que aguardam execução diminua significativamente. Segundo um relatório apresentado pela comissão criada pelo TST para estudar os problemas nas execuções, como as medidas não precisam de reforma na legislação para entrar em vigor, porque uma lei já autoriza que as sentenças sejam cobradas como títulos, os tribunais só precisam se mobilizar para criarem convênios com institutos de protesto de títulos e serviços de proteção ao crédito.
Para Fava, “essas novas formas de cobrança são fabulosas e têm chamado a atenção pela efetividade que vêm dando. Se uma sentença da Justiça do Trabalho tem caráter alimentar, não é possível que o empresário priorize pagar uma duplicata a pagar uma sentença, tem que ser o contrário”. O juiz contou, também, que sempre que inscreveu dívidas trabalhistas em serviços de proteção ao crédito, a empresa se mobilizou para pagar a execução, porque “a não ser que esteja falida, a empresa vai fazer o que puder para não ficar com o nome sujo”.
Dentre as sugestões apontadas pela comissão do TST, cujas implantações serão coordenadas e monitoradas por um grupo de cinco juízes, de cada região do país, o corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Carlos Alberto de Paula, destacou o gerenciamento dos depósitos judiciais, o incentivo da conciliação na execução, a criação de um Banco Nacional de Devedores, de um Banco Nacional de Penhora e a realização de leilão eletrônico unificado, para evitar que o mesmo bem seja penhorado ou leiloado por juízos diferentes.
Segundo o corregedor, outras medidas que podem dar resultado imediato são: uma legislação trabalhista mais moderna e a inclusão do desempenho do juiz na fase de execução como um dos critérios da promoção na carreira. “Muitos juízes não dão atenção a essa fase porque ela não ajuda na promoção e, aí, a execução não anda”, lamenta.

PPS apresentará emenda à Constituição para acabar com reeleição no Executivo


Por: Nadja Rocha  no PPS23


O PPS apresentará  PEC (Proposta de Emenda à Constituição) em que  proíbe a reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos. O objetivo da legenda é dar moralidade ao pleito e impedir o uso da máquina pública por parte dos candidatos.

“Queremos provocar uma decisão do Congresso Nacional sobre essa  questão. No Brasil, a reeleição tem sido  maléfica à alternância de poder e à moralidade pública”, afirmou o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP).

O parlamentar citou como exemplo disso as irregularidades praticadas pelo ex-presidente Lula, que, segundo ele, aparelhou o Estado  e desrespeitou as leis. “Para se reeleger, usou e abusou (...) Para eleger sua sucessora, fez de tudo. Desmoralizou as instituições,  teve uma atitude de deboche em relação às punições da justiça eleitoral. Ou seja, o instituto da reeleição sofreu um duro golpe com Lula”, afirmou.

Segundo Freire, é preciso impedir que presidentes, governadores e prefeitos desfrutem de vantagens do cargo que são dificilmente superadas por seus concorrentes. “Quem os suceder, ou substituí-los nos seis meses anteriores ao pleito também não poderá concorrer às eleições”, defende Roberto Freire.

A emenda constitucional do PPS veda ainda as coligações nas eleições proporcionais e trata do financiamento público de campanha, dentre outras questões a serem debatidas na reforma política.

Sistema eleitoral misto

O partido também defende o sistema  eleitoral misto, baseado no modelo adotado na Alemanha. Por esse sistema, explica Freire, os estados são divididos em distritos equivalentes à metade do número de vagas no Legislativo. A outra metade dos deputados é eleita  por uma lista preordenada pelos partidos. Os nomes e a ordem de preferência na relação são definidos nas convenções de cada legenda. “As duas formas de voto juntas fortalecem a vontade popular, os partidos e democracia representativa”, definiu o parlamentar.

As propostas do PPS serão defendidas pelo senador Itamar Franco (MG) e o deputado Sandro Alex (PR), representantes do partido nas comissões especiais da reforma política no Senado e na Câmara, respectivamente.


Dilma projeta mínimo de R$ 616 em 2012


Edson Sardinha no Congresso em foco

Em seu programa semanal de rádio, a presidenta Dilma Rousseff reafirmou a disposição do governo de elevar para R$ 616 o salário mínimo em 2012. Esse valor havia sido sinalizado anteriormente pela equipe econômica para convencer a base aliada no Congresso a votar a proposta do Executivo. Segundo ela, a partir de agora o país tem uma lei de valorização salarial que dá “segurança e estabilidade” ao trabalhador que ganha salário mínimo. “Nós queremos é continuar a valorização do salário mínimo para gerar riquezas e para fazer a roda da economia girar com vigor, porque o salário mínimo tem impacto direto na vida das pessoas e na economia do país”, declarou a presidenta.

A lei que fixa o piso em R$ 545 e define a política de valorização do mínimo até 2015 foi sancionada na sexta-feira (25) pela presidenta e publicada na edição de hoje do Diário Oficial da União (DOU). 

Dilma também comentou sobre as 152 mil vagas de emprego geradas em janeiro. Para ela, os números são um "sinal importante". “Desde 92, o governo acompanha o mercado de trabalho, e nunca havia registrado um crescimento das vagas tão grande no mês de janeiro como aconteceu no ano passado e este ano – isso é a roda da economia girando. E se depender do empenho do meu governo, tenha certeza, essa roda vai girar mais e mais, vai ajudar o país a gerar riquezas, a reduzir a pobreza e a construir uma vida melhor para todos e todas”, afirmou a petista no Café com a Presidenta:

Leia a íntegra do programa:

“Apresentador: Presidenta, definido o salário mínimo de R$ 545,00, valendo a partir de amanhã, 1º de março. E, junto com ele, o Congresso aprovou as regras para os aumentos do mínimo nos próximos quatro anos. Como é que vai ser isso, presidenta? 

Presidenta: Olha, Luciano, esse é um momento importante para o trabalhador. E o principal é que agora temos uma lei que dá segurança e estabilidade para o trabalhador e para a trabalhadora que ganha um salário mínimo. Na sexta-feira, eu assinei a lei que cria a política de longo prazo de valorização do salário mínimo, com ela, todos sabem de antemão quais são as regras e os critérios de aumento do salário mínimo, daqui até 2015. 

Apresentador: E como estas regras vão funcionar? 

Presidenta: Primeiro, Luciano, eu quero lembrar que a Lei de Valorização do Salário Mínimo consolida um acordo fechado pelo governo Lula com os trabalhadores, por meio das centrais sindicais, ainda em 2007. A primeira regra, Luciano, acertada é a seguinte: é preciso garantir que o salário mínimo não perca o valor e, para isso, ele precisa acompanhar a inflação. Porque se o preço do alimento subir, o preço do transporte subir, o preço das roupas subir, o salário também tem que subir junto. 

Apresentador: Isso é a chamada correção pela inflação, não é? 

Presidenta: Isso mesmo, Luciano. Mas dar apenas a inflação não é suficiente para aumentar o poder de compra do salário mínimo ao longo do tempo. Todo mundo merece melhorar de vida, não é? Então, o que ficou acertado é a segunda regra: além da inflação, o salário mínimo tem que ter um ganho real, uma valorização. E este aumento real deve acompanhar o crescimento da economia. Você sabe, não é, Luciano, que aumento da economia aparece em um número chamado Produto Interno Bruto, o PIB, é ele que todo ano diz se a economia cresceu ou não, e quanto ela cresceu. 

Apresentador: Sei. Nós, jornalistas, gostamos de simplificar, dizendo que o PIB mostra como foi a produção de riquezas do país. 

Presidenta: É essa a ideia. Quando o país produz mais riquezas, o trabalhador também deve ganhar mais. É esse ritmo da economia que o salário mínimo passou a acompanhar, Luciano. 

Apresentador: Quer dizer, se a economia cresce, ótimo; mas se ela cai, o trabalhador perde salário? 

Presidenta: Não, Luciano, o trabalhador não perde salário. Quando a economia não cresce ou mesmo diminui, o cálculo do reajuste considera que o crescimento do PIB foi zero, nulo – não há desconto de salário mínimo. Mas o mínimo, ainda nesse caso, tem a correção pela inflação. É o que aconteceu em 2009. A economia caiu, o mínimo não caiu, ele vai ser corrigido agora pela inflação e por isso vai chegar a R$ 545,00. 

Apresentador: Então, o salário mínimo cresce menos, mas o poder de compra fica garantido? 

Presidenta: Isso mesmo. O trabalhador, Luciano, fica protegido. 
Apresentador: Presidenta, com esta lei agora aprovada já daria para imaginar o salário mínimo de 2012? 

Presidenta: Olha, Luciano, fazendo uma conta rápida, já que ainda não temos todos os números, estará em torno de 13%, mais ou menos, o aumento. Porque a economia cresceu bastante no ano passado, acima de 7%, mais a inflação de 2011, vamos chegar, nós estamos calculando, a um salário mínimo de R$ 616,00 no início do ano que vem. Com essa regra aprovada no Congresso, Luciano, vai ser um ganho real importante, você não acha? 

Apresentador: A senhora tem uma avaliação dos resultados dessa política nos últimos anos? 

Presidenta: Veja, Luciano, o que nós queremos é continuar a valorização do salário mínimo para gerar riquezas e para fazer a roda da economia girar com vigor. Porque o salário mínimo tem impacto direto na vida das pessoas e na economia do país. Isso significa mais comida na mesa, uma vida melhor para muita gente, e mais dinheiro circulando, não é, Luciano, o que faz a roda da economia girar. 

Apresentador: É verdade. E quando a economia gira, aumenta a oferta de emprego. 

Presidenta: É isso aí, uma coisa puxa a outra. O salário sobe e as pessoas compram mais, as vendas crescem, a produção aumenta e novos empregos aparecem. Uma comprovação disso é a quantidade de empregos criados agora em janeiro: 152 mil novas vagas. É um sinal importante. Olha, desde 92, o governo acompanha o mercado de trabalho, e nunca havia registrado um crescimento das vagas tão grande no mês de janeiro como aconteceu no ano passado e este ano – isso é a roda da economia girando, Luciano – e se depender do empenho do meu governo, tenha certeza, essa roda vai girar mais e mais, vai ajudar o país a gerar riquezas, a reduzir a pobreza e a construir uma vida melhor para todos e todas. Por isso, Luciano, lema do meu governo é: país rico é país sem pobreza. 

Apresentador: Você ouviu a presidenta Dilma Rousseff falando sobre emprego e sobre a nova lei de valorização do salário mínimo. Obrigado, presidenta, pelas informações, e até semana que vem. 

Presidenta: Eu te agradeço muito, Luciano. Tchau."

É Lei = Participação dos empregados


LIK ==>>   Empregados de empresas estatais terão participação nos conselhos de administração, nas empresas com mais de 200 empregados será eleito um representante entre os trabalhadores , com o objetivo de promover o entendimento direto com os empregadores.


O salário mínimo e a judicialização da política - Luiz Werneck Vianna


Luiz Werneck Vianna  no Valor Econômico
 A controvérsia sobre o salário mínimo escapou dos gabinetes palacianos, onde foi objeto de acordo, em 2007, entre o governo Lula e as centrais sindicais, ganhou o Parlamento, submetida à votação nas duas Casas congressuais, e por pouco não atingiu as ruas. Agora, tudo indica, a se confiar nas declarações transcritas pelos jornais de líderes políticos da oposição, que mudará de arena, migrando para o Poder Judiciário por meio de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) a ser impetrada por eles no Supremo Tribunal Federal.

A matéria dessa ação não diria respeito aos aspectos substantivos - o valor do salário mínimo -, e sim aos procedimentais, uma vez que o artigo 3º da lei aprovada delega ao Executivo, nos próximos três anos, mediante decreto, a fixação do mínimo conforme fórmula prevista nesse novo diploma legal. Na leitura dos partidos minoritários, tal delegação significaria uma usurpação de poder do Legislativo em favor do Executivo, vindo contra disposições expressas da Constituição, que, no seu artigo 7º, inciso IV, dispõe que o salário mínimo deve ser fixado por lei. A maioria defende a constitucionalidade da nova lei, sustentando que os futuros decretos presidenciais sobre o valor do mínimo apenas cumpririam a vontade já expressa do legislador.

Como se vê, a controvérsia imprevistamente mudou de forma, deslocando-se do plano econômico-corporativo para o político-institucional, quando passa a admitir a arbitragem do Judiciário, o Tertius constitucional. Mais um caso, entre tantos, na moderna democracia brasileira, do assim chamado processo de judicialização da política, recurso hostilizado por alguns em nome de presumidas filiações ao republicanismo da Revolução Francesa de 1789, que teria fixado como princípio dogmático o império da vontade majoritária. Além do fato de que esse princípio não foi consensual entre os revolucionários franceses, os contestadores do controle de constitucionalidade das leis por parte do judiciário desconsideram outra robusta tradição republicana, a da revolução americana, que trouxe consigo a sua institucionalização.

Mas, sobretudo, não levam em conta a inequívoca vontade do legislador constituinte brasileiro de abrigar esse instituto no sentido de proteger sua obra de eventuais mutilações, respaldada por uma teoria democrática que admite, como intérpretes da Constituição, filha da soberania popular, entre outros, atores originários da sociedade civil, como os partidos, e as associações empresariais e de trabalhadores.

Certamente este é o caso do ilustre presidente do Senado, José Sarney, o ex-presidente da república sob cujo mandato foi elaborada e promulgada a Carta de 1988, que, ao criticar a iniciativa da oposição, declarou que "chamarmos o Supremo como uma terceira via é uma coisa que deforma o regime democrático", sentenciando "que as questões políticas devem ser resolvidas dentro do Parlamento" (Valor, 25/02/2011, p.10). Essa não é, sem dúvida, uma opinião isolada, merecendo ser ouvida, embora a questão em tela esteja longe de ser bem encaminhada com soluções ao gosto do senso comum.

A emprestar alcance universal ao que preconiza essa declaração, a segregação racial nos Estados Unidos poderia ter resistido, sabe-se lá por quanto mais tempo, às sucessivas tentativas dos parlamentares que combatiam aquele odioso sistema. Notório que, diante dos impasses e das divisões reinantes no sistema político americano, foi o Judiciário quem cortou o nó górdio daquele litígio com suas evidentes, na conjuntura da época, ameaças de guerra civil, em uma solução típica de judicialização da política, que, como se verificou, criou um ambiente de paz nas relações raciais daquela sociedade.

Como anota um conhecido especialista no assunto, a judicialização da política somente encontra campo para sua manifestação em países de regime político democrático, diante de um Judiciário autônomo das instâncias do poder e de franquia, garantida constitucionalmente, das liberdades civis e públicas. A propósito, nessa outra margem do Mediterrâneo, onde agora se alastra o levante de povos inteiros contra regimes autocráticos, vigem mecanismos institucionais que permitam a seus cidadãos exercer o controle de constitucionalidade das leis?

A floração do constitucionalismo democrático nos países de sistema da "civil law", coincide, não por acaso, com a derrota, em 1945, do nazi-fascismo, e com a convicção, então generalizada na opinião pública internacional, de que um sistema de poder com as características desumanas daquele não deveria se repetir. Como se sabe, na Alemanha de 1933, a ascensão do nazismo ao poder transitou sob a chancela do princípio do voto majoritário. A partir daí, sob a inspiração da Declaração de Direitos Humanos, firmada pela ONU em 1948, as democracias ocidentais passaram a positivar em suas constituições determinados valores, materiais e procedimentais, constituindo o que alguns denominam o núcleo dogmático das constituições, e, como tais, não passíveis de derrogação por eventuais expressões da vontade majoritária.

Mas, esse é apenas um dos aspectos das atuais mutações por que passam as relações entre os poderes republicanos, com a emergência, em escala mundial, do fenômeno da judicialização da política. Outro, decisivo, tem sede na própria ação do legislador que, por imperativos da complexidade das sociedades contemporâneas, produz leis com cláusulas de caráter aberto e indeterminado, admitindo o juiz no papel de legislador implícito. E mais tantos outros, inclusive o fato, só na aparência trivial, de que o instituto das ações de controle de inconstitucionalidade "pegou" no Brasil: são cerca de 200 Adins ao ano, e, aliás, o PT, hoje, partido no governo, quando na oposição, foi um dos grandes campeões na sua propositura.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Dilma - Mary Zaidan




A presidente Dilma Rousseff tem recebido elogios rasgados pelo seu jeito de ser. Mas, não fosse o contraponto com o seu padrinho, o que ela não diz ou as obviedades que diz não fariam sucesso.
Reservada, séria, trabalhadora, gestora de ponta. Essas são algumas das qualidades a ela atribuídas. Porém poucas – a não ser pela comparação com estilo carnavalesco do ex-presidente Lula – resistem aos fatos. A começar por ela freqüentar o local de trabalho e lá ficar por horas a fio, o que não é mérito algum; a maior parte dos brasileiros faz.
Nas poucas aparições públicas, Dilma repetiu mesmices com a profundidade de um pires sobre educação em cadeia de TV convocada, na verdade, para lançar o slogan do governo - Brasil, país rico é país sem pobreza -, jargão de gosto duvidoso. Desdisse os ministros Miriam Belchior e Guido Mantega quanto ao corte no PAC. Fez-se de brava. Mas não passou disso.
Os puxões de orelha de Dilma só aparecem em relatos de assessores e asseclas. Ninguém viu, ninguém ouviu. Pior: se aconteceram, não tiveram conseqüência.
Ela teria puxado os lóbulos do ministro da Energia Edson Lobão, que não conseguiu produzir explicação convincente sobre o apagão do Nordeste nem no dia seguinte, nem na semana seguinte, nem até hoje. Lobão continua firme e forte. E quem se lembra que os motivos do apagão não foram fornecidos? Possivelmente nem Dilma.
Dias antes, relatou-se que a presidente perdera a paciência com o ministro da Educação Fernando Haddad pelas sucessivas pisadas no tomate com o Enem e o Sisu. Não há testemunhas do pito. Sabe-se apenas que, sem qualquer bronca, Haddad ainda se dá ao luxo de arrasar o tomateiro ao permitir que faculdades reprovadas no Enade por dois anos consecutivos possam ser credenciadas ao Pró-uni. Um problema que se arrasta desde 2007.
O ministro do Esporte Orlando Silva também teria, dizem, ouvido poucas e boas da presidente. Se assim foi, fez ouvidos moucos. E ainda teve o desplante de classificar como “lacunas e falhas” o desvio de dinheiro público de seus correligionários do PC do B, denunciados por O Estado de S. Paulo. Dilma, de novo, nada disse.
Isso sem contar que após o anúncio de corte de R$ 50 bi, a presidente gestora-mor informou ao respeitável público a criação de mais um ministério e duas estatais.
Mais curioso ainda é ver os confetes por ela defender a liberdade de imprensa. De tão acostumado às ameaças do governo Lula, o país parece não se atinar que liberdade não é concessão de um governante; é princípio e obrigação.

Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa, @maryzaidan
 no Blog do Noblat

GILBERTO DIMENSTEIN - Uma incrível lição sobre a maconha


Uma série de sites está revolucionando o conceito que se tem de transparência, a exemplo do WikiLeaks

ALIMENTADA POR DEZENAS DE milhares de pessoas e atualizada diariamente na internet, uma espécie de Bolsa de Valores informa publicamente quanto custa a maconha na maioria das cidades norte-americanas. Chega-se ao requinte de informar o preço no mercado de acordo com a qualidade do produto: ruim, regular e bom.
O leitor pode imaginar que ouvi essa "dica" de algum estudante num dormitório ou cafeteria aqui em Harvard, mas a verdade é que a informação foi transmitida numa solene sala de aula, quando se mostrava a comunicadores como as novas tecnologias impactam a produção e a distribuição de conhecimento. Depois desse exemplo, apareceu na tela o que poderíamos chamar de "bolsa do crime": trata-se de um programa que permite que se saiba de forma simples e ricamente ilustrada quais foram os crimes, divididos em suas várias modalidades, que ocorreram em cidades dos Estados Unidos nas últimas 24 horas. Entre eles está a venda de drogas.
Neste momento, em que as revoltas no Oriente Médio são atribuídas, pelo menos em parte, às novas tecnologias, que estão produzindo uma geração de jovens informados e conectados, a "bolsa da maconha" serve curiosamente também para ilustrar como o cidadão consegue se informar e se mobilizar sem depender tanto dos meios tradicionais de comunicação.

 

Aplicativos que não custam quase nada ou, em certos casos, nada mesmo já permitem que sejam editados em poucos minutos no celular, durante o calor dos acontecimentos, programas de rádio (Poddio Audio Editing) ou de televisão (First Video). Quem está acostumado com as pesadas e caras máquinas dos estúdios de rádio e televisão sabe muito bem o que isso significa.
Quem rala para degravar uma entrevista de horas sabe o valor de um programa recém-lançado (Voice Base) que coloca no papel em tempo real o que foi gravado no celular. A entrevista degravada pode ir direto para o Facebook ou para o Twitter.
Não é necessário mais digitar no celular enquanto se está dirigindo para saber onde fica determinado restaurante ou loja, basta apenas falar para receber o mapa com a localização (Vlingo).

 

Disseminam-se mecanismos para checar informações que podem aguçar o poder crítico do indivíduo e ajudar no trabalho de apuração dos jornalistas.
Uma série de sites está revolucionando o conceito que se tem de transparência, a exemplo do WikiLeaks, responsável pela divulgação de documentos secretos que provocou grande impacto em vários países. Aliás, nesta semana saiu um livro que detona a credibilidade do WikiLeaks, escrito por um de seus altos funcionários.
Sites permitem fazer facilmente extraordinários cruzamentos. Enquanto se acompanha uma votação parlamentar ou uma proposta apresentada por um governante, é possível ver na tela do computador os mais diferentes tipos de ligação e de interesse de cada político, quais são seus negócios, quem dá dinheiro para a sua campanha, com quem tem obras ou contratos -e até suas viagens ou os presentes que ganha, inclusive de nações estrangeiras.
Um programa criado recentemente (Poligrapf) extrai trechos de uma notícia e informa detalhes sobre as entidades envolvidas em determinados eventos. Com isso, a notícia pode ficar mais transparente para o leitor.

 


Pode-se pensar que, com tudo isso, o jornalista é uma espécie em extinção. Muito pelo contrário. Com tanta informação disponível em qualquer canto, cada vez será mais necessário haver gente treinada para distinguir o que é essencial do que é supérfluo. Se algum leitor tiver alguma dica, envie que eu incluo.

 

PS- Preparei uma seleção com todos os sites mencionados nesta coluna (www.catracalivre.com.br) para que leitor possa um fazer exercício de cidadania digital e deixar alguns reis nus.

gdimen@uol.com.br

na Folha de São Paulo

BUEMBA! BUEMBA! - JOSÉ SIMÃO - Vamos sair no bloco da Ansiedade!






Informar é preciso - DORA KRAMER



DORA KRAMER - O Estado de S.Paulo
Uma sugestão singela para as excelências senatoriais que depois de amanhã fazem a primeira reunião da comissão que discutirá a reforma política: que tal ouvir o que pensam os eleitores a respeito, conhecer seus anseios e a partir daí estruturar um sistema de comunicação capaz de integrar representantes e representados num esforço conjunto de aperfeiçoamento?
Como? É ingênua a proposta? Não, apenas lógica. Como falamos de sistema representativo, é preciso levar em conta os dois lados da história, a fim de que não estejamos mais uma vez tratando de mudanças que interessam apenas a um deles.
O eleitor pode não entender, e a maioria não entende mesmo, os jargões da política. Mas sabe bem, ou ao menos intui, o que lhe desagrada.
Um obstáculo evidente nessa história é a desigualdade de condições: enquanto os políticos dominam muito bem o assunto, a sociedade nem sequer sabe o significado de determinados termos e conceitos.
Quantos conseguem dizer o que é voto distrital? Quem domina os cálculos do sistema proporcional? E a chamada "janela" de infidelidade partidária, as pessoas por acaso sabem que na prática isso altera por determinado período sua vontade expressa nas urnas?
Pelo seguinte: se, como se ventila agora, durante os últimos seis meses antes da próxima eleição o parlamentar puder ir para onde quiser estará subtraindo em seis meses o tempo de validade do voto dado à época da eleição, quando estava no partido.
E o voto obrigatório, alvo de críticas de todos os lados, mas justificado com o argumento de que o "brasileiro" não está suficientemente educado e politizado para o voto facultativo?
Por acaso alguém informa que dos 232 países do mundo apenas 24 adotam o voto obrigatório, sendo 13 deles na América Latina?
E assim a desinformação grassa também em relação a temas como escolha por lista fechada, financiamento público de campanha - já existente nas verbas do fundo partidário e no horário "gratuito" no rádio e na televisão - e a distorção federativa da representação da Câmara.
E o que seria esse ponto de nome tão pomposo? Simples: por obra do regime ditatorial, o general Ernesto Geisel promoveu uma mudança no critério de formação das bancadas, estabelecendo um mínimo (8) e um máximo (70) de deputados por Estado.
A ideia era fortalecer a representação de Estados mais dependentes do governo federal. Pois a ditadura acabou e hoje há Estados sub-representados e outros super-representados. Exemplo: São Paulo tem um deputado para cada 585 mil habitantes, enquanto em Roraima um parlamentar representa 51 mil cidadãos. Nos Estados Unidos a representação é alterada conforme a variação populacional.
E a diferença entre presidencialismo e parlamentarismo, o Brasil sabe qual é? No plebiscito de 1993 venceu a desinformação, porque se convenceu a Nação de que o parlamentarismo significa apenas que deputados mandam e desmandam no País.
Aquela parte sobre a efetiva corresponsabilidade com o bom andamento do governo que pode cair mediante voto de desconfiança foi relegada ao limbo do desconhecimento.
Assim vamos de novo entrando na discussão sobre reforma política em situação de desequilíbrio total: os políticos sabendo demais e a população sabendo de menos.
Se os especialistas no tema se dedicassem a esmiuçar cada ponto, tudo muito explicado, detalhado com prós e contras, o cidadão então bem informado poderia fazer suas escolhas, cobrar e se manifestar, com conhecimento de causa, sobre o que acha certo ou errado.
Utópica a sugestão? Não, apenas lógica, mas sem a menor chance de ser aceita pela óbvia evidência de que à ampla maioria do Congresso não interessa saber o que pensa a sociedade muito menos contribuir para a educação política do público. Pois sabemos como é: na falta de informação prevalece a manipulação.
Inspiração. Carlos Ayres Britto, ministro do Supremo Tribunal Federal: "O Rio de Janeiro é Deus com sua melhor roupa de sair". 


Distritinho e distritão - GAUDÊNCIO TORQUATO



GAUDÊNCIO TORQUATO - O Estado de S.Paulo
Ponto um: nos termos do parágrafo único do artigo 1.º da Constituição, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".
Ponto dois: nos termos dos artigos 45 e 46 da Constituição Federal, os deputados federais representam o povo e os senadores representam os Estados e o Distrito Federal. Ponto três: os deputados são eleitos pelo sistema proporcional e os senadores, pelo sistema majoritário.
Ponto quatro: se o povo vota em um candidato e este, com sua bagagem de votos, leva para o Parlamento mais dois ou três de contrabando, esses excedentes ferem o princípio constitucional alinhavado no primeiro item.
Ponto cinco: a representação popular, para ganhar respeito e legitimidade, deve se submeter a uma radiografia moral a fim de se conformar aos ditames constitucionais.
Ponto seis: o exercício do poder em nome do povo é tese ancorada na hipótese de escolha dos eleitos de acordo com o preenchimento das vagas que cabem a cada Estado. Ponto sete: essa hipótese abriga o voto majoritário, que, adotado na escolha dos representantes do povo, acabaria com a excrescência gerada por coligações proporcionais, pela qual o eleitor vota em um candidato e, alheio à sua vontade, elege mais um, dois ou até mais de três.
Dito isso, vale perguntar: que vertentes abrigam o voto majoritário? Neste início de debate sobre reforma política, que Senado e Câmara começam a debater sob a égide de comissões específicas, duas propostas se sobressaem por privilegiar o voto majoritário: os sistemas conhecidos como "distritinho" e "distritão". O primeiro, que tem como um de seus defensores o governador paulista, Geraldo Alckmin, se assenta na ideia de escolha dos representantes a partir de distritos, pelo critério dos mais votados, abolindo-se as coligações partidárias. Teria como finalidade estabelecer ligação mais estreita entre o parlamentar e as regiões. A representação popular seria escolhida exclusivamente por este critério - o voto distrital puro -, abolindo-se, dessa forma, o voto em lista partidária.
Pelo segundo sistema, o "distritão", cujo maior defensor é o vice-presidente da República, Michel Temer, seriam eleitos os mais votados até o limite das vagas por Estado. Esse método eliminaria também a distorção de eleição de pessoas sem votos suficientes para representar o povo. Nesse caso, o distrito seria o próprio Estado (distritão), diferente da proposta anterior, de repartir o ente federativo em unidades distritais em conformidade com suas densidades eleitorais.
Entre as duas propostas, qual a mais condizente com o preceito constitucional? O "distritão" parece mais afinado à letra normativa. O Estado como distrito e circunscrição eleitoral, nos termos propostos por Temer, se ajusta melhor ao modelo de representação do povo brasileiro, esteja ele em São Paulo ou no Acre. O deputado é a voz do povo no Parlamento. Já a concepção do "distritinho", nos termos apregoados por Alckmin, aponta para a identificação do parlamentar com a localidade, a espacialidade, características próximas da representação senatorial. O senador é a voz do Estado no Parlamento. Ademais, o poder econômico é mais forte em regiões restritas. É aí que predomina a força dos cabos eleitorais. É aí que se flagra o "voto de cabresto", diferente do voto de opinião, racional e crítico, que emerge no seio dos conjuntos mais avançados politicamente.
O argumento de que o voto majoritário enfraquece os partidos é sofisma. Para começo de conversa, o que seria melhor para vivificar a política: 28 siglas amorfas ou 10 partidos com ideários fortes e claros? A massa pasteurizada da política é produzida pelos laboratórios de conveniências da estrutura partidária. Dizer que as campanhas, hoje, são realizadas em nome dos partidos é faltar com a verdade. Hoje, vota-se no perfil individual, não no partido. As campanhas são fulanizadas. Todos os entes - com exceção de uma ou outra sigla do extremo ideológico - bebem em fontes incolores, insossas e inodoras.
O que ocorreria com a adoção do voto majoritário e consequente eliminação das coligações proporcionais seria a integração/fusão de partidos. A busca de maior força e densidade propiciaria natural integração de parceiros, principalmente de pares com identificação histórica ou parentesco ideológico.
É improvável que os partidos, no afã de obter grande votação, passem a compor suas chapas com demagogos, populistas, celebridades e famosos. Uma plêiade de olimpianos (perfis que habitam o Olimpo da cultura de massa) tenderia a se isolar. Fora de seu hábitat, sem vocação e motivação, acabariam sendo objeto de muita crítica. Após a fosforescência inicial, os pequenos "deuses" desceriam à terra dos mortais, tornando-se figuras banais, até porque não contariam mais com agasalho midiático. O que será de Tiririca sem o chapéu de palhaço no circo da mídia? A vida útil de uma celebridade, sem a luz do farol, é curta. Não se deve esquecer, ainda, de que o País, a cada ciclo histórico, avança na estrada civilizatória. Haverá um momento em que o eleitor, mais racional, exigirá que cada macaco permaneça em seu galho.
Quanto ao voto em lista fechada - visto por alguns como eixo de fortalecimento dos partidos -, são evidentes as consequências perversas que gera, ao conferir excessivo poder aos caciques partidários. Estes formariam as listas posicionando os nomes de acordo com suas conveniências.
Cada sistema de sufrágio, como se pode aduzir, comporta prós e contras, alguns mais que outros, mas o critério de escolha pela via do voto majoritário, e atendendo ao preceito da escolha dos mais votados, parece, seguramente, o mais adequado. Para o eleitor, tal método se apresenta ainda como o mais lógico e de fácil compreensão. Começar o debate sobre reforma política pelo sistema de voto é, portanto, a mais auspiciosa notícia da estação.
JORNALISTA, É PROFESSOR TITULAR DA USP E CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO 

Votação sobre Irã é 1º teste de Dilma na ONU



Maria do Rosário vai expor em Genebra a visão do governo em relação aos direitos humanos

Jamil Chade - O Estado de S.Paulo
A Organização das Nações Unidas (ONU) realiza amanhã em Genebra sua sessão mais importante de direitos humanos no ano, com a situação na Líbia, Oriente Médio e Irã na mesa de discussão. A expectativa é ver como a diplomacia brasileira vai se posicionar e qual será a mensagem que Dilma Rousseff enviará à comunidade internacional.
O Brasil será representado pela ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, escalada para apresentar pela primeira vez no novo governo a visão do Palácio do Planalto na ONU. A ministra discursará no Segmento de Alto Nível do Conselho. O encontro com a cúpula da ONU terá a presença da secretária de Estado norte-americana Hillary Clinton, da chefe da diplomacia da Europa, Catherine Ashton, e de ministros do Irã, Venezuela, China e Rússia.
Votação. O mais importante teste virá com a votação de um projeto sobre os direitos humanos no Irã. "Ainda que nos anos mais recentes o Brasil tenha apresentado justificativas de voto em que ressalta sua preocupação com situações específicas, isso não substitui um voto condenatório", disse Iradj Roberto Eghrari, representante da Comunidade Bahá"í do Brasil. "Se Dilma de fato mudar o voto brasileiro, o País voltará à posição que defendia de 1996 a 1999, quando votava de maneira coerente com os valores e princípios da sociedade brasileira."
Ao Estado, o embaixador da França na ONU, Jean Baptiste Mattei, afirmou que já vê mudança no comportamento do Brasil. "Parece que estão evoluindo", disse, desculpando-se em seguida pelo uso da palavra. "Não quero dizer que não estavam evoluídos. Apenas que agora parece haver maior cooperação." Um negociador britânico revelou a "satisfação" da Europa em ver o Brasil adotando posições mais próximas às democracias ocidentais. "Essa é uma grande notícia."
"Estamos finalmente acordando", ironizou Julie de Rivero, da Human Rights Watch. Peter Spindler, da Anistia Internacional, destacou a posição positiva do Brasil em se aliar ao grupo de democracias ocidentais e pedir uma reunião de emergência para lidar com a Líbia, na sexta-feira.
Entre os regimes autoritários, a curiosidade para saber o que pensa o novo governo do Brasil é grande. Há uma semana, Cuba, países islâmicos e China ficaram irritados com uma delegação do Itamaraty, que mediava uma reforma do Conselho de Direitos Humanos a fim de dar mais poderes à ONU na convocação de reuniões de emergência sobre um país. Para diplomatas que acompanham as negociações, a comunidade internacional vai avaliar se, com o governo Dilma, o Brasil mudou não só o discurso, mas seu posicionamento nessa área. 


Economia reacende divergência no PT



Esquerda do partido ataca corte de gastos e política de juros de Dilma, a exemplo do que fez com Lula na reforma da Previdência

Roldão Arruda - O Estado de S.Paulo
O estilo de governar dos petistas Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva pode ser diferente, como já tem sido dito. Há, porém, uma característica idêntica entre os dois que está ficando cada vez mais evidente: a capacidade de, no início do mandato, irritar a ala à esquerda do PT.
Olhando com atenção é possível notar também a presença de um personagem comum nas duas histórias: Antonio Palocci. Ministro da Fazenda na partida do governo Lula e chefe da Casa Civil com Dilma, tanto antes como agora ele tem sido apontado como mentor de medidas econômicas que, segundo os críticos, ficariam melhor no ideário neoliberal do que no petismo.
Em 2003, a esquerda atacou a proposta de reforma da Previdência e as metas de superávit primário, que ficavam acima das estabelecidas no governo anterior, do tucano Fernando Henrique Cardoso, e significavam contenção de gastos. Agora, critica-se a forma como Dilma quer frear a inflação, com mais juros e redução de gastos.
Em artigo postado no site do PT, o consultor Vladimir Pomar, um dos fundadores do partido e coordenador da campanha de Lula, em 1989, diz que as medidas adotadas por Dilma tendem a comprimir o consumo e favorecer a continuidade da miséria. "Superar a miséria significa, em termos bem precisos, elevar o poder de consumo de alguns milhões de brasileiros desprovidos dessa capacidade", diz ele.
Na maior central sindical do País, a CUT, vinculada ao PT, o presidente Artur Henrique também critica a opção do governo: "Sou contra a ideia de que o único instrumento para controlar a inflação é o aumento da taxa de juro, com redução da demanda".
Coro. Os dois engrossam um conjunto de vozes que começou a ganhar evidência na reunião do Diretório Nacional do PT, no dia 10. Na ocasião, tanto o presidente José Eduardo Dutra quanto José Dirceu, um dos líderes da corrente Construindo um Novo Brasil, a mais forte no partido, manifestaram preocupação com as medidas de Dilma. Dirceu, repetindo o que já havia dito em seu blog, também bateu na tecla de que aumentar juro não é a única forma de se combater a inflação e ainda citou casos de países que adotaram saídas diferentes, como Chile, Turquia e Rússia.
Não foram os únicos. Outros integrantes do diretório, com menor projeção política, também manifestaram preocupação, cuidando para que suas declarações não fossem tornadas públicas, nem aparecessem no documento final da reunião.
Markus Sokol, da corrente O Trabalho, situada na ponta extrema da esquerda, distribuiu um documento no qual afirmava, entre outras coisas, que "o povo não votou por arrocho salarial e redução de despesas". O deputado estadual Raul Pont (PT-RS), da corrente Democracia Socialista, também manifestou preocupação. Disse que o governo Lula só acertou o passo quando apostou no crescimento econômico, com o PAC e a nomeação de Guido Mantega para a Fazenda.
Para Pont, a política econômica do início do governo Lula, que parece trilhada por Dilma, foi desenhada por Palocci, hoje na Casa Civil. "Acho que o PT deve chamar o Mantega para pedir explicações", afirma.
Na semana passada, o PC do B, partido da base aliada do PT, fez um disparo mais direto. Altamiro Borges, integrante do Comitê Central, divulgou um artigo no qual dizia: "As velhas teses ortodoxas voltaram a ganhar força no Palácio, sob o comando do todo poderoso ministro Antonio Palocci"