sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Enquanto o mundo árabe é sacudido, cresce a influência do Irã


The New York Times
Michael Slackman 
Manama (Bahrein)

As revoltas populares que estão sacudindo o mundo árabe começaram a mudar o equilíbrio de poder na região, reforçando a posição do Irã e enfraquecendo e enervando sua rival, a Arábia Saudita, disseram especialistas regionais.

Apesar de ser cedo demais para escrever o capítulo final do impacto dos levantes, o Irã já se beneficiou com a queda ou enfraquecimento dos líderes árabes que eram seus mais fortes adversários e já começou a projetar sua crescente influência, disseram os analistas. Nesta semana, o Irã enviou dois navios de guerra ao Canal de Suez pela primeira vez desde sua revolução em 1979 e os novos líderes militares do Egito permitiram que eles passassem.

A Arábia Saudita, uma aliada dos Estados Unidos e uma nação sunita que disputa com o Irã xiita por influência regional, foi abalada. O rei Abdullah sinalizou sua preocupação na quarta-feira, ao anunciar um aumento de US$ 10 bilhões em gastos em bem-estar social para ajudar os jovens a se casarem, comprar casas e abrir empresas, um gesto visto como uma tentativa de rechaçar o tipo de descontentamento que alimenta os protestos por toda a região.

Abdullah então se encontrou com o rei do Bahrein, Hamad bin Isa al Khalifa, para discutir formas para conter o levante político por parte da maioria xiita de lá. Os líderes sunitas da Arábia Saudita e do Bahrein acusam suas populações xiitas de lealdade ao Irã, uma acusação rejeitada pelos xiitas, que dizem que ela visa apenas incitar as tensões sectárias e justificar a oposição à democracia.

Os levantes são movidos por preocupações domésticas. Mas eles já destruíram um paradigma regional, o trio de Estados alinhados com o Ocidente que apoiava o diálogo com Israel e a contenção dos inimigos de Israel, incluindo o Hamas e o Hizbollah, disseram especialistas. O campo pró-diálogo formado por Egito, Jordânia e Arábia Saudita agora está em pedaços. Hosni Mubarak do Egito foi forçado a renunciar, o rei Abdullah da Jordânia está lutando para controlar o descontentamento em seu reino e a Arábia Saudita ficou sozinha para enfrentar um crescente desafio ao seu papel regional.

“Eu acho que os sauditas temem estarem cercados –Iraque, Síria, Líbano; o Iêmen está instável; a situação em Bahrein é muito incerta”, disse Alireza Nader, um especialista em assuntos internacionais para a Rand Corp. “Eles temem que a região esteja propícia para exploração iraniana. O Irã mostrou ser muito capaz de tirar proveito da instabilidade regional.”

“O Irã é o grande vencedor aqui”, disse um consultor regional para o governo americano, que falou sob a condição de anonimato por não estar autorizado a falar com a imprensa.

As circunstâncias poderiam mudar para o Irã, alertaram os especialistas, caso exagere sua mão ou caso os movimentos populares árabes se ressintam da interferência iraniana na região. E de modo algum é certo que grupos pró-Irã dominariam a política no Egito, Tunísia e outros lugares.

Por ora, Irã e Síria saem fortalecidos. Qatar e Omã estão pendendo para o Irã, enquanto a situação é indefinida no Egito, Tunísia, Bahrein e Iêmen.

“Se estas ordens políticas árabes ‘pró-americanas’, que estão sendo contestadas por movimentos de protesto significativos, se tornarem mais representativas de suas populações, elas certamente demonstrarão menos entusiasmo por uma cooperação estratégica com os Estados Unidos”, escreveram Flynt Leverett e Hillary Mann Leverett, ex-integrantes do Conselho de Segurança Nacional, por e-mail.

Eles acrescentaram que no momento, os líderes do Irã viram que “o equilíbrio regional está mudando, de modos potencialmente decisivos, contra seu adversário americano e a favor da República Islâmica”. A posição do Irã está mais forte apesar de seus problemas internos, a economia em dificuldades, o alto desemprego e uma oposição política determinada.

Os Estados Unidos também podem enfrentar dificuldades ao apresentar seus argumentos contra o programa nuclear iraniano, afirmaram alguns especialistas.

“Os eventos recentes também desviaram o foco do programa nuclear iraniano e podem tornar um consenso regional e internacional em relação às sanções ainda mais difícil de obter”, disse Nader.

A crescente confiança do Irã se baseia em um realinhamento gradual que teve início após as consequências do 11 de Setembro. Ao derrubar o Taleban no Afeganistão e depois Saddam Hussein no Iraque, os Estados Unidos removeram dois dos inimigos regionais do Irã que trabalhavam para conter suas ambições. Hoje, o Irã tem grande influência em ambos os países, uma consequência não desejada.

O Irã demonstrou sua postura fortalecida no início deste ano no Líbano, quando seu aliado, o Hizbollah, forçou o colapso do governo pró-Ocidente de Saad Hariri. Hariri foi substituído por um primeiro-ministro apoiado pelo Hizbollah, uma ação ousada que os analistas disseram ter sido realizada com apoio do Irã.

“O Iraque e o Líbano agora estão na esfera de influência do Irã, com grupos que foram apoiados pelos linhas-duras por décadas”, disse Muhammad Sahimi, um especialista em Irã em Los Angeles, que frequentemente escreve sobre a política iraniana. “O Irã é um grande agente no Afeganistão. Qualquer regime que vier a despontar no Egito não será tão hostil em relação ao Hamas quanto era Mubarak, e o Hamas é apoiado pelo Irã. Isso pode ajudar o Irã a aumentar sua influência ali ainda mais.”

O Irã também poderia se beneficiar da crescente assertividade dos xiitas em geral. O xiismo está longe de ser monolítico e o Irã não fala em nome de todos os xiitas. Mas os membros dessa seita estão ligados pela fé e por seu forte senso de serem vítimas de discriminação pela maioria sunita. Os eventos no Bahrein ilustram bem essa conexão.

O Bahrein conta com cerca de 500 mil habitantes, 70% deles xiitas. O país é governado por uma família sunita desde que foi tomado dos persas no século 18. Os xiitas há muito argumentam que sofrem discriminação no trabalho, na educação e na política. Na semana passada, eles iniciaram um levante popular exigindo democracia, algo que os colocaria no poder. O governo inicialmente fez uso de força letal para impedir a oposição, matando sete pessoas. Ele agora está pedindo por um diálogo enquanto os manifestantes, saindo às ruas em grande número, estão exigindo a renúncia do governo.

Mas os manifestantes têm mantido sua lealdade para com o Bahrein. O chefe do maior partido xiita, Al Wefaq, disse que o partido rejeita o tipo de governo islâmico do Irã. Na terça-feira, um importante membro do partido, Khalil Ebrahim al Marzooq, disse temer que o rei tente transformar a disputa política em uma disputa sectária. Ele disse que há rumores de que o rei abriria a fronteira com a Arábia Saudita e deixaria os extremistas sunitas entrarem no país para atacar os manifestantes.

“No momento em que alguma fronteira for aberta pelo governo, isso significa que outras fronteiras serão abertas”, ele disse. “Você não espera que as pessoas vejam seus semelhantes de seita serem mortos e não interferirão. Nós não os chamaremos.”

Mas, ele disse, eles virão.

Nadim Audi contribuiu com reportagem.
Tradução: George El Khouri Andolfato

Um comentário:

  1. A Grande derrocada do Império Americano está começando, e não têm data para terminar, o que eles fizeram com a URSS foi o começo do fim para eles, com o fim da URSS que tinha no seu ponto forte o ateismo, ficou claro que o Oriente Médio com o Islã iria se tornar um foco central na religião. Hoje o que se vê é Religião dominando o Oriente Médio.

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