- O Estado de S.Paulo
Num regime democrático, órgãos públicos tratam com respeito e consideração os cidadãos, que, afinal, pagam impostos para sustentar a estrutura dos Três Poderes da República. No Brasil, contudo, os contribuintes, principalmente quando se trata de recebimento de indenizações por desapropriações ou por infração a direitos adquiridos, se deparam com obstáculos burocráticos que exigem intermináveis demandas judiciais para reconhecimento do que lhes é devido.
Em setembro do ano passado, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu como legítimos os direitos de revisão dos valores mensais pagos a 124 mil aposentados e pensionistas prejudicados pelas emendas 20/1998 e 41/2003, que alteraram o teto de aposentadoria, sem levar em conta os direitos daqueles que contribuíram com a cota máxima anteriormente estabelecida e que prevalecia entre abril de 2008 e dezembro de 2003. Eles também deveriam ser reembolsados pelos atrasados, segundo o STF. Só que, para obter essa reparação, cada aposentado ou pensionista deveria entrar com ação na Justiça, apesar de o processo julgado pelo STF ser considerado de "repercussão geral".
Na época, o governo prometeu fazer espontaneamente o reajuste para todos os prejudicados e pagar os valores em atraso. Como 2010 foi um ano eleitoral, esperava-se que isso acontecesse logo, mas tudo ficou na promessa. Somente agora o Ministério da Previdência Social tomou medidas para reparar as perdas dos aposentados.
O INSS já está enviando cartas àqueles aposentados e pensionistas, avisando que, a partir de setembro, receberão seus proventos reajustados. Quanto aos atrasados, foram fixadas quatro datas para pagamento, entre outubro deste ano (para quem tem R$ 6 mil a receber) até janeiro de 2013 (para ressarcimento de quantias acima de R$ 19 mil).
A Previdência fez a coisa certa. Milhares de ações perderão sentido, contribuindo para desafogar a Justiça. É evidente que aqueles aposentados que não concordarem em receber os atrasados em prazos relativamente dilatados poderão recorrer à Justiça e, eventualmente, receber o que lhes é devido antes das datas fixadas. Contudo, como sempre cabe recurso - e o INSS não deve descartar essa possibilidade - dificilmente os autores das ações receberão antes do prazo, dada a lentidão da Justiça brasileira. Acresce que, como as ações devem ser ajuizadas até cinco anos depois da decisão do STF, muitos desistirão de reivindicar seus direitos na Justiça, para não falar daqueles que nem mesmo estão informados sobre essa possibilidade.
O espaçamento dos prazos pela Previdência Social para acertar as contas dos atrasados é justificável, uma vez que o valor de um desembolso único seria muito elevado. Embora o déficit da Previdência venha sendo reduzido, em razão do aumento do volume de contribuições de novos trabalhadores registrados em carteira, ele ainda é muito elevado, tendo alcançado R$ 21,86 bilhões de janeiro a julho deste ano. Além disso, como o pagamento extra mensal junto com o atrasado beneficia uma parcela considerável de aposentados, o dinheiro tenderia a ir para o consumo, ainda muito aquecido.
Há quem diga que o governo, com a recente medida do INSS, quis dar uma "compensação" aos inativos depois do veto da presidente Dilma Rousseff ao dispositivo na Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) que previa aumento real em 2012 para os aposentados que percebem mais de um salário mínimo por mês.
Pode ser, mas o mais importante a ressaltar nesse caso é a força do exemplo. Há várias outras questões relativas a aposentadorias em exame pelo STF, como a questão das reaposentadorias, etc. O que se espera é que o governo considere como jurisprudência consolidada qualquer decisão que seja tomada por aquela Corte, aceitando e implementando imediatamente o que lhe couber, evitando assim que milhares de ações individuais sejam impetradas na Justiça Federal.
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