Gabriel Manzano - O Estado de S.Paulo
Um partido que em sua fase heroica avançava impelido pelos sonhos da militância e agora se move pela rotina dos funcionários. Que convive com a presença "opressiva" de um grande líder e é controlado por "uma geração política que envelhece sem novas lideranças". Cuja força eleitoral, "como a estrela que a simboliza", é apenas "o brilho de uma realidade que já desapareceu".
É do PT que se fala - e a voz é de um antigo militante, o hoje historiador da USP Lincoln Secco. Sincero, dando nome às coisas, ele acaba de lançar um livro sobre os 31 anos de existência do partido. História do PT (Ateliê Editora) chega num momento conturbado da sigla - o início do terceiro mandato na Presidência entremeado de escândalos, queda de ministros e desentendimentos entre legenda, aliados e a presidente Dilma Rousseff. De quebra, um congresso nacional que se empenhou em trazer de volta o debate sobre marco regulatório e controle da mídia.
A confusão é pedagógica. "Não faria sentido escrever essa história antes de o PT passar pelo teste do poder", diz o autor. "Só recentemente ficou possível contar como surgiu e evoluiu a militância, depois o período de refluxo do sindicalismo e, por fim, o modo como ele se sai no exercício do poder."
Não chega a ser uma catilinária indignada contra os malfeitos petistas, mas é um relato bem diferente do que os dirigentes do partido gostariam que a militância lesse. Embora não personalize os episódios - o que enfraquece o poder da narrativa -, Secco expõe conflitos, decepções, o abandono da bandeira da ética. Como destacou ao Estado, dois terços dos filiados entraram no PT nos últimos dez anos, período de ascenção do partido ao poder. "É muito diferente entrar num partido que se diz socialista quando ele já é uma oportunidade de carreira", afirma o autor, com certa ironia.
Ao falar do "pragmatismo" de prefeitos petistas que, nos anos 90, ajudaram a financiar um caixa 2 para o partido, ele resume: "Era a forma encontrada (pelo partido) para a contradição entre os impulsos sociais, que ainda o animavam, e a integração à ordem, que o seduzia".
Lulismo. Um tema recorrente, além das disputas entre correntes internas, é a fluida relação entre Lula e o PT. "Procuro mostrar que o lulismo nunca se separa do petismo. As políticas sociais do líder são as consagradas pelo partido", afirma.
"Mas o lulismo não é só invenção do líder, é também uma construção da base eleitoral que o apoia. E essa base, nascida de seus programas sociais, quer ordem, não radicalismo. Ela tem demandas próprias, mas não quer conflitos com a classe dominante. O sucesso de Lula é ter entendido isso."
Secco discorda dos que alegam que Lula não se desgasta porque os pobres não ligam para a ética. "Como já dizia Joaquim Nabuco, o povo parece perdoar com mais facilidade os que se parecem com ele", avalia.
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