sexta-feira, 29 de julho de 2011

Editorial = O Estado de S.Paulo - O novo pacote cambial



- O Estado de S.Paulo
Até aqui, tudo bem: o governo conseguiu frear a valorização do real e até inverter a trajetória do câmbio, com sua nova intervenção no mercado de moedas. O dólar em queda tem sido um pesadelo para o industrial brasileiro, porque encarece as exportações e favorece o concorrente estrangeiro também no mercado interno. A ameaça ao fabricante nacional é também uma causa de preocupação para o trabalhador, porque a perda de vendas pode resultar em demissões. Mas o governo já havia tomado outras medidas para conter o desajuste cambial. Desde 4 de outubro de 2010 até 4 de julho deste ano foram anunciadas 14 alterações políticas - aumentos de imposto, novas normas para operações financeiras e mudanças na atuação do Banco Central (BC). Todas produziram algum efeito por tempo limitado, mas foram insuficientes para mudar a tendência. Falta saber, agora, até quando as medidas apresentadas na quarta-feira pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, poderão impedir ou frear a depreciação do dólar.
Quando a nova intervenção foi anunciada, a moeda americana estava na cotação mais baixa em 12 anos, no Brasil. A valorização do real, iniciada antes da crise de 2008, foi detida durante breve período e recomeçou quando a economia brasileira voltou a crescer. A emissão de enorme volume de dinheiro pelo banco central dos Estados Unidos contribuiu para a depreciação do dólar. A tendência foi reforçada, recentemente, com o risco de calote da dívida pública americana.
Diante desse quadro é fácil entender por que o Ministério da Fazenda decidiu intervir. Desta vez, a intervenção tem algumas características especiais. A Medida Provisória 539 atribuiu ao Conselho Monetário Nacional (CMN) amplos poderes para regular o mercado de derivativos cambiais, fixando limites, impondo depósitos compulsórios e tributando as operações especulativas. As primeiras medidas foram reguladas pelo Decreto 6.306.
Por enquanto, a ideia é cobrar 1% de imposto sobre a diferença entre a posição vendida e a posição comprada em derivativos cambiais, quando o excedente for superior a US$ 10 milhões. Além disso, quem liquidar antecipadamente empréstimos externos contratados por prazo superior a 720 dias pagará 6% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Em tese, o CMN poderá intervir muito mais agressivamente no mercado, se o desajuste cambial se ampliar de forma considerada perigosa. No limite, poderá elevar o IOF sobre o excesso de posições vendidas até 25%.
É cedo, no entanto, para dizer até onde as autoridades financeiras estarão dispostas a avançar na adoção de medidas mais duras. As novas barreiras poderão servir por algum tempo, mas em breve surgirão brechas ou formas de contorná-las. Talvez as condições do mercado internacional estimulem os especuladores a continuar apostando na valorização do real. Nesse caso, a resposta do governo poderá ser maior elevação do IOF, mas cada novo lance da política oficial produzirá mais distorções. Alguns críticos já apontaram o risco mais evidente: os investidores e especuladores poderão simplesmente levar suas operações para bolsas fora do Brasil.
Além do mais, a intervenção nas operações com derivativos atinge apenas uma parte do problema. Será a mais importante? A inundação de dólares tem ocorrido no dia a dia, por meio de investimentos e de empréstimos. O BC se mantém como o grande comprador de moeda americana, em seu permanente esforço para enxugar o mercado de câmbio. Também a certeza dessa atuação é um estímulo para quem planeja despejar dólares no mercado brasileiro, obter reais e ganhar mais dinheiro com os juros elevados.
As novas medidas podem funcionar em caráter emergencial. Mas não servirão para mudar a tendência do dólar no mercado internacional. Além disso, os juros continuarão sendo um poderoso fator de atração, enquanto o BC tiver de cuidar sozinho da contenção da alta de preços. O quadro só mudará quando o peso do combate à inflação for dividido entre a política monetária e a política fiscal. Isso ocorrerá quando o governo se dispuser de fato a conter seus gastos. Por enquanto, isso está fora da agenda. 


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