Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Valentes, mas não ao ponto de explicitar insatisfação em caráter irrevogável, deputados do PR reagem às demissões no Ministério dos Transportes com ameaças veladas ao governo.
O líder do partido na Câmara, Lincoln Portela, reivindica isonomia no rigor para toda base aliada e diz que a presidente Dilma Rousseff está "brincando com fogo".
O deputado Luciano de Castro avisa que, atingido "na cabeça e no coração", o PR "não tem mais que ter medo de perder o que já não existe".
Outros tratam de disseminar a versão de que tão logo volte do recesso e reassuma sua cadeira no Senado, o ministro exonerado Alfredo Nascimento fará um discurso para pôr os pingos nos is.
De seu ponto de observação na trincheira do PMDB, o notório Eduardo Cunha pontifica: "É preciso tomar cuidado para isso não se transformar em regra: sai nos jornais e revistas e vai direto para o Diário Oficial".
O restante do partido, vice-presidente da República inclusive, fica na encolha. Provavelmente esperando para ver se a faxina é um espasmo e passa ou se a regra é para valer, para todos e por tempo indeterminado.
Enquanto isso, suas excelências buscam, nos bastidores, abrigo na concepção flexível de ética e na falta de interesse do ex-presidente Lula em que, uma vez (e se) consolidada a dinâmica da vassoura impiedosa, as comparações de estilo evoluam para a constatação de que o antecessor deixou uma herança para lá de maldita à sucessora.
A maneira desabrida de Lula privilegiar a lealdade em detrimento dos bons costumes é que levou as coisas do fisiologismo ao atual estado de degradação. Logo, se a presidente estiver mesmo decidida a mudar o padrão, a opinião pública acabará percebendo o que nos últimos oito anos achou mais cômodo não perceber.
Daí as versões de que Lula está "preocupado" com a saúde da base governista, enxergando riscos à governabilidade no modo Dilma de lidar com as denúncias (por hora só) relativas ao Ministério dos Transportes.
Quais seriam esses riscos?
Depende da atuação da presidente. Se ela der vazão à impetuosidade à deriva, como no caso em que mandou Antonio Palocci ameaçar o vice Michel Temer com a demissão dos ministros do PMDB se o partido não votasse o Código Florestal na Câmara tal como queria o governo, o perigo de isolamento é real.
Terá a maioria do Congresso contra ela e poderá acabar em maus lençóis quando precisar de amparo.
Agora, se agir com precisão e fundamento na correção dos rumos do que estiver realmente malfeito, o que farão diante do apoio que ela receberá da sociedade?
Declarar independência ou morte? Chamar o povo às ruas? Atear fogo às vestes? Pedir demissão coletiva de todos os cargos?
Sem unidade nem credibilidade, por hora os parceiros do consórcio blefam e torcem para que a chuva seja de verão.
Dois fervendo. O presidente da Infraero, Gustavo Matos do Vale, saiu na quarta-feira literalmente correndo de uma solenidade na Base Militar de Brasília, após receber um telefonema.
Era Dilma chamando para mandar que Vale desse um "sacode" na empresa aérea Gol por causa dos atrasos e cancelamentos no dia anterior em Congonhas.
Dividendos. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, pode sair no lucro com a crise no PR, que, além das agruras com o governo federal, enfrenta um racha interno.
A primeira ideia dos insatisfeitos era fundar um novo partido, mas eles chegaram à conclusão de que não daria tempo de tomar todas as providências legais até setembro, data limite para poder concorrer às eleições municipais de 2012.
O plano B é a adesão ao PSD de Kassab. O prefeito já recebeu alguns deputados do PR para conversar a respeito.
Ela acha. Pode ser até que não seja, mas a presidente Dilma pôs na cabeça que José Serra será o candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo.
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