Hideraldo Caron, diretor de Infraestrutura, aprovou assinatura de contrato com Prefeitura de Canoas, comandada por Jairo Jorge (PT), apesar de 2 pareceres da Advocacia-Geral da União terem alertado sobre manobras para liberar verba
Leandro Colon - O Estado de S.Paulo
Contrariando dois pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU), o diretor de Infraestrutura Rodoviária do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Hideraldo Caron, orientou a aprovação de um contrato de R$ 30 milhões com a prefeitura de Canoas (RS), comandada pelo prefeito Jairo Jorge, do PT. O convênio foi assinado em janeiro de 2010 e até agora não saiu do papel.
O dinheiro do contrato, celebrado em 2010 pelo prazo de dois anos, não é para melhoria de estradas. É destinado à construção de 599 unidades habitacionais para 2 mil sem-terra que ocupam a chamada "Vila do Dique", um terreno próximo à construção da BR-448, obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que liga Porto Alegre a outras cidades gaúchas. Dos R$ 30 milhões previstos, R$ 28 milhões são do Dnit.
Hideraldo Caron é filiado ao diretório petista no Rio Grande do Sul e participou pessoalmente das negociações em Canoas, tendo inclusive comparecido à cidade gaúcha para assinar os documentos. O petista deve perder o cargo, sobretudo por pressão do PR, que teve vários apadrinhados políticos afastados na esteira da crise nos Transportes.
Um ano e meio depois da assinatura do contrato, o projeto de construção das casas não andou. Com apenas mais seis meses de vigência, provavelmente terá de ser prorrogado.
O Estado teve acesso aos pareceres jurídicos dos procuradores da AGU sobre o convênio com a prefeitura de Canoas. Eles trabalham dentro do Dnit para dar orientação jurídica ao órgão. Em pelo menos duas oportunidades, apontaram falhas no contrato, incluindo manobras para liberar o dinheiro.
Mesmo assim, a diretoria do órgão vinculado ao Ministério dos Transportes aprovou o repasse com base em relatório da Diretoria de Infraestrutura, de número 23/2010, dirigida por Caron. O contrato foi assinado por ele e pelo diretor-geral, Luiz Antônio Pagot, este último afastado do cargo após as denúncias de corrupção no órgão. O Dnit alega que contou com o aval do Ministério do Planejamento para assumir a despesa. A pasta, na ocasião, era comandada pelo também petista Paulo Bernardo.
Sem amparo legal. Entre as supostas irregularidades apontadas pelos procuradores no contrato com Canoas está a falta de amparo legal para o Dnit gastar dinheiro na construção de casas para sem-terra, desviando de sua finalidade ligada a obras em rodovias. "A política de assentamento exposta nos autos não dá respaldo à utilização de verba do Dnit para esse propósito, tendo em vista que as verbas que lhes são destinadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias têm como fim o desenvolvimento de suas atividades fins e o reassentamento é atividade fim do Ministério das Cidades, segundo seu regimento interno", diz o parecer.
O documento ainda aponta uma manobra, por meio de um aditivo, para a liberação dos recursos. O contrato foi assinado no dia 15 de janeiro de 2010 sem qualquer previsão orçamentária registrada, o chamado "empenho". Sendo assim, o dinheiro não poderia ser liberado. O Dnit segurou a publicação do convênio no Diário Oficial da União (DOU) e criou um aditivo alterando a data de vigência do contrato de janeiro para 1.º março - a publicação no DOU ocorreu somente no dia 30 daquele mês, a seis meses das eleições.
"Pretende-se deslocar a data de assinatura do aditivo sob análise para possibilitar o repasse pretendido, fato de antemão, que nos parece ser inviável, diante da suposta infringência da legislação", alerta o parecer dos procuradores. Eles lembram que, entre a assinatura do contrato em janeiro e sua publicação em agosto, passaram-se dois meses. "É praxe do Dnit imediatamente se publicar seus atos".
A AGU também chama a atenção para o cronograma de pagamentos à prefeitura. Seriam R$ 16,5 milhões de uma só vez no primeiro semestre de 2010. "Não nos parece compatível com o previsto", dizem os procuradores, lembrando que o valor correto seria de R$ 5 milhões.
Ao remeter a posição final da procuradoria à Diretoria de Infraestrutura do Dnit, em junho de 2010, o procurador-chefe do órgão, Fábio Marcelo Duarte, informa que foram feitos dois pareceres, sendo que o segundo estava "voltando a se insurgir contra a celebração do Termo de Compromisso"entre prefeitura e Dnit. Ele ressalta, no entanto, que a diretoria do Dnit já havia decidido e autorizado a aprovação do contrato "soberanamente". Não cabia à AGU, disse, "se opor àquela celebração".
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