segunda-feira, 9 de maio de 2011

Manobra liquida dívidas de partidos com verba pública



PT chegou ao fim de 2010 com dívida de R$ 16 milhões, mas este ano embolsará R$ 16,8 milhões do Fundo Partidário; tucanos podem até ter superávit

Daniel Bramatti, de O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO - Os rombos que o ano eleitoral de 2010 deixou nas contas do PT e do PSDB serão integralmente cobertos por recursos públicos em 2011, graças à manobra do Congresso que, em janeiro, elevou em R$ 100 milhões os repasses da União para o Fundo Partidário.
Depois de bancar parte da campanha presidencial de Dilma Rousseff, além de outros candidatos a governos estaduais e ao Congresso, o PT chegou ao fim de 2010 com um déficit de quase R$ 16 milhões - número divulgado semana passada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas receberá cerca de R$ 16,8 milhões extras neste ano graças ao incremento do Fundo Partidário, aprovado por unanimidade pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso e nem sequer debatido pelo plenário.
No caso dos tucanos, a receita extra será exatamente igual ao déficit nas contas de 2010: R$ 11,4 milhões. Como o PSDB tem uma dívida pequena de eleições anteriores, de cerca de R$ 500 mil, com essa ajuda poderá até encerrar o ano com superávit.
No total, o Orçamento da União destinará este ano R$ 265 milhões para o Fundo Partidário, ao invés dos R$ 165 milhões previstos. Mas os líderes partidários acharam pouco. Em uma articulação cuja paternidade nunca foi reivindicada, eles turbinaram o Fundo Partidário em 56% em termos reais, o maior aumento anual desde 1995, quando foi fixado em R$ 0,35 por eleitor.
"É um claro exemplo de legislação em causa própria", disse o cientista político Aldo Fornazieri, diretor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. "Os partidos fizeram um cálculo e elevaram o Fundo Partidário para cobri-las."
Se nos últimos 15 anos o Fundo Partidário tivesse sido corrigido apenas pela inflação, além de acompanhar o aumento do eleitorado, estaria hoje em cerca de R$ 150 milhões, ou 57% abaixo do valor atual.
Recuo no Planalto. Depois de o Estado ter revelado a manobra para "estatizar" dívidas da campanha de 2010, em janeiro passado, Dilma chegou a avaliar a possibilidade de vetar a injeção de R$ 100 milhões no cofre dos partidos. Assessores fizeram circular a versão de que ela teria ficado insatisfeita com a atitude dos parlamentares, principalmente em um momento em que seria necessário anunciar cortes para equilibrar as contas do governo.
Mas Dilma não enfrentou o lobby dos partidos. Em uma reunião com a presidente, em fevereiro, os ministros Antonio Palocci (Casa Civil) e Luiz Sérgio (Relações Institucionais), ambos do PT, disseram-lhe que o aumento do fundo havia sido fruto de acordo entre legendas da base e da oposição. Os ministros temiam que o descontentamento com um eventual veto se refletisse em votações de interesse do governo no Congresso - principalmente a do salário mínimo.
Brecha. A estatização das dívidas da eleição evidencia a existência de um financiamento público de campanhas disfarçado no País, segundo especialistas como Carlos Melo, cientista político do Insper.
Em tese, o Fundo Partidário deveria subsidiar a manutenção dos partidos - aluguel de sedes, pagamento de funcionários, aquisição de equipamentos etc. Mas não há impedimentos legais para seu uso em campanhas.
Como os recursos públicos são, no caixa dos partidos, misturados a doações privadas e a contribuições de filiados, é impossível calcular quanto do fundo é aplicado em eleições.
Do total de R$ 212 milhões arrecadados pelo PT em 2010, 87% foram desembolsados em "despesas com fins eleitorais".
Já o PSDB teve receita de R$ 139 milhões, sendo que 84% desse valor foi consumido em gastos relacionados às eleições.
Estado procurou os responsáveis pelas finanças dos dois partidos, João Vaccari Neto (PT) e Márcio Fortes (PSDB), mas não obteve resposta aos pedidos de esclarecimentos.



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