quinta-feira, 3 de abril de 2014

Entrevista de Aécio Neves à Reuters



Brasília (DF) – Em entrevista concedida à Agência Reuters, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, respondeu perguntas sobre as eleições, o sentimento de mudança que predomina na maior parte do eleitorado,  as propostas do PSDB para a economia, as relações com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), reajuste do salário mínimo, a Copa do Mundo,  o setor elétrico e a responsabilidade fiscal dos estados. A seguir, os trechos da entrevista concedida nesta quinta-feira (2).
Eleições
O que diferencia essas eleições das outras eleições é um claro sentimento de mudança. O dado relevante em pesquisas nesse momento é este, o que capta sentimentos e não o que capta intenção de voto com candidaturas ainda com níveis de conhecimento tão distintos entre elas. Isso passa a ter alguma importância após a exposição de todos os candidatos. Esse sentimento de mudança é absolutamente o oposto e inverso daquele que tínhamos em 2010, em que havia sentimento de continuidade, com a economia crescendo a 7,5 por cento, emprego crescendo 10 por cento, o presidente Lula com altíssima popularidade.
Sentimento de mudança
Vou voltar a 2010, existia naquele momento o sentimento de continuidade, e a candidata do governo só foi vista como tal a partir de julho. Então, para ter um paralelo, a Dilma só vestiu o figurino da continuidade, a mãe do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), a mulher do homem, a continuadora da obra do Lula, só foi passar o (José) Serra no final de julho, quando as pessoas passam a estar atentas ao processo eleitoral. Agora é hora do combate político, como nós estamos fazendo, da demonstração das fragilidades do governo, mas isso se transformar em ativo é só no final de julho. A economia está mostrando a absoluta crise que estamos vivendo e de incerteza em relação ao futuro. Na infraestrutura o Brasil patina e nos indicadores sociais paramos de avançar.
Essa última pesquisa Ibope mostra que 64% querem mudanças profundas. Desses, 70% não sabem quais são os nomes dos candidatos de oposição ainda. Então, só o tempo e a exposição nos veículos de massa vão nos permitir (subir nas pesquisas). Nós temos que ter a capacidade para as pessoas olharem para nós e enxergarem na nossa candidatura a mudança segura que o Brasil precisa. Esse é o termo, nós somos a mudança segura. Pela experiência que temos, pela capilaridade que temos no país, pelo conjunto de pessoas qualificadas que estão no nosso entorno. Então eu tenho muita confiança de que nós vamos vestir esse figurino na hora certa e acho que a partir de julho e agosto as pesquisas passam a ser um fator importante.
Pesquisas
Setenta por cento da população não sabem quem é Aécio Neves, 80 % não sabem o que Eduardo Campos (governador de Pernambuco e pré-candidato à Presidência pelo PSB) fez. É o desconhecimento. O fato de os dois candidatos da oposição nunca terem disputado uma eleição nacional faz com que haja, sobretudo na Região Nordeste, no meu caso, e na população de baixa renda um desconhecimento ainda muito grande. Isso não nos assusta, exatamente porque no momento certo as pessoas buscam uma candidatura que representa mudança. E elas precisarão ver essas candidaturas falarem, precisarão se confrontar com essas candidaturas. Isso só vai acontecer efetivamente nos grandes veículos de comunicação a partir do final da Copa do Mundo. Até lá não há razões concretas para uma mudança efetiva nas pesquisas de intenção de votos. Há no humor das pessoas.
PSDB e economia
No primeiro momento, eu acho que uma eleição do PSDB traz um efeito positivo, inverso ao efeito Lula de 2002, cuja eleição gerou um clima de incerteza muito grande, o dólar e a inflação dispararam. Uma eleição do PSDB terá efeito inverso. Vai tranquilizar mercados, vai de alguma forma já na largada transmitir uma sinalização de confiança para atores e parceiros externos, e temos que utilizar esse nosso ativo para dar a largada em algumas ações que acho que são necessárias.
Em primeiro lugar, no campo tributário. Temos que dar sinalização de que acabarão essas desonerações pontuais, vamos em seis meses apresentar uma proposta de simplificação do sistema tributário que nos dará espaço para uma gradual diminuição da carga. O que será uma questão de impacto que vamos fazer, nós vamos restringir o aumento dos gastos correntes em relação ao crescimento da economia. Os gastos não crescerão mais do que a economia como crescem hoje. Essa conta não vem fechando.
Ministérios e Secretaria de simplificação do sistema tributário
Primeiro, algumas questões são simbólicas, não só pelos valores. Nós vamos cortar pela metade o número de ministérios que está aí. Vamos criar apenas uma secretaria extraordinária de simplificação do sistema tributário com os melhores especialistas do setor para num prazo de seis meses ter uma proposta que permita a partir da simplificação abrir espaço para ao longo do tempo ter uma diminuição da carga. Essa secretaria é para apresentar a proposta ao Congresso e depois ela é extinta.
Nós vamos sinalizar de forma muito clara que no Brasil governado por nós haverá respeito absoluto aos contratos, nós queremos estimular a parceria com o setor privado em todas as áreas que isso for possível, desde que interesse ao Estado brasileiro.
Gastos do governo
É quase como uma lei de responsabilidade federal. Já existe nos Estados e municípios e não existe para a União. Nós vamos resgatar uma política fiscal austera, transparente, que foque no centro da meta (de inflação) e não no teto na meta como está sendo feito hoje. Não espero facilidades, não vamos esperar um ambiente de tranquilidade no início do governo. Mas uma certeza que eu posso dar é que, se vencer as eleições, não governarei de olho nas curvas de popularidade. Se eu precisar passar quatro anos devendo popularidade para fazer o que tem que ser feito, eu vou fazer. É a única chance que nós temos de resgatar parte das conquistas que estão indo embora. Infelizmente, a agenda de hoje é a agenda de 10 anos atrás. Enquanto nós devíamos estar falando em aumento da competitividade da nossa economia, estamos voltando a falar de crise de confiança, volta de inflação. Essa sim é a herança maldita que o PT vai deixar ao sucessor.
Eu posso dizer que estou preparado para as medidas impopulares, vamos limitar gastos correntes, vamos qualificar os gastos públicos. E aí trago minha experiência de Minas Gerais, que acho que é muito relevante. Minas é o único Estado hoje que avalia o conjunto, 100 por cento dos seus servidores, que recebem um bônus no final do ano quando atingem a meta estabelecida. Acho que temos que ter metas também para o governo federal.
Setor Elétrico
Temos que primeiro respeitar os contratos que estão assinados, mas nós vamos abrir discussão sobre, por exemplo, o setor do petróleo. Se em determinadas áreas é mais vantajoso fazer pelo modelo de concessão ou pelo modelo de partilha.
Vamos discutir isso à luz do dia, sem o viés ideológico. Do ponto de vista das concessões de energia, repito, respeitado o que está aí, todos queremos que haja o barateamento do custo de energia. Energia cara é aquela que você não tem. E hoje ela está faltando.
Política de reajuste do salário mínimo
Ela foi uma conquista e não penso em mexer na política do salário mínimo. Temos é que investir fortemente na formalização do mercado de trabalho. É um dos instrumentos que temos para ajudar a diminuir o déficit previdenciário. Isso vem acontecendo inclusive, reconheço, mas temos que ser mais eficazes na política de estímulo à formalização. Mas não é uma questão que esteja na prioridade, defender uma nova política de reajuste que não garanta um crescimento real. Essa é uma conquista que temos que conviver com ela. Foi uma conquista, até porque foi feita também com o nosso apoio. Não acredito que haja espaço para modificação, pelo menos no curto prazo, na política do salário mínimo.
Eduardo Campos
Não conheço com profundidade as propostas do Eduardo Campos. O que eu vejo com alegria, até porque se trata de um candidato que esteve nas hostes governistas, participou do governo Lula e a própria Marina, que deve ser sua vice, também participou, vejo com muita alegria que eles venham para o campo oposicionista. E que eles passem a incorporar um discurso que nós já vínhamos defendendo há muito tempo, de eficiência na gestão pública, do desalinhamento ideológico na política externa, uma nova interlocução com o mundo desenvolvido.
Tenho defendido a fuga dessas amarras da relação aduaneira que impediu o Brasil de firmar acordos bilaterais com vários países do mundo. Em 10 anos, firmamos acordos com Egito, Palestina e Israel. O México, que compete conosco, está fazendo uma lista de reformas muito interessantes que não fizemos e então é uma bola da vez muito mais interessante que o Brasil. O que eu vejo é que há no discurso do Eduardo uma aproximação ao nosso discurso: respeito ao mercado, uma gestão mais profissional, com acompanhamento mais efetivo das políticas sociais.
Acho que pelas responsabilidades dos gestores do PSDB, teremos uma capacidade mais clara de representar mudanças. Mas a candidatura do Eduardo é essencial para o jogo político.
Copa do Mundo e eleições
É uma coisa nova, vamos ter que aprender. Não acho que o resultado dentro de campo influencie o resultado fora de campo. Acho que talvez na década de 1970. O Brasil está evoluído para isso. O que pode influenciar é o resultado fora de campo, da fragilidade da nossa infraestrutura e da nossa mobilidade. Do que foi prometido extra campo, principalmente em mobilidade, 23% (do proposto) serão entregues. 77% não. Isso pode ser cobrado.
A responsabilidade por essa baixa entrega não é culpa, também, dos governos estaduais?
Eu acho que não, porque esse compromisso com mobilidade é do governo federal. Mas claro que, como vimos nas manifestações, todos os governantes sofreram. Acho que aí há um efeito colateral do hiper presidencialismo que vivemos no Brasil. A força do poder central é tão grande, para o bem, para distribuir benesses e dizer que o Brasil superou a miséria, mas também na cobrança. Quando veem transporte caótico e saúde trágica, eu acho que o governo federal é o primeiro, mas não obstante acho que governos estaduais também sofrerão.

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