Domingo, 21 de novembro. O segundo turno das eleições de Burkina Faso deve terminar daqui a pouco com a recondução do atual presidente Blaise Compaorè, chefe supremo do país desde 1987 depois de um golpe de estado que matou o ex, Thomas Sankara, de quem Compaorè fora ministro. De acordo com as Nações Unidas, Burkina Faso é o terceiro país mais pobre do mundo. Com pouco mais de 16 milhões de habitantes, também é líder absoluto em analfabetismo. Só 24% da população sabem ler e escrever. Portanto, poucos devem entender o que faz uma embaixada do Brasil no centro da capital Uagadugu. E é mesmo incompreensível. Para burkinenses e brasileiros.
Menos compreensível ainda é a insistência da diplomacia do governo Lula em dar guarita a ditaduras sanguinárias e a regimes que se lixam para os direitos humanos. Nesta semana que passou, repetiu a dose. E com um agravante: contradisse a presidente eleita ao negar aval à proposta canadense de condenação ao Irã pela prática de apedrejamento.
Dilma também se absteve. Preferiu não comentar a opção de neutralidade do país que ela presidirá daqui a 40 dias. Nem parecia a mesma Dilma que, na primeira entrevista coletiva à imprensa depois de eleita, rechaçou o apedrejamento da iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani.
A resolução da ONU contra a lapidação foi aprovada com o apoio de 80 países, entre eles EUA, Canadá, Japão, Chile e Argentina, além de todas as nações européias. Foi rejeitada pelos mesmos de sempre: Venezuela, Bolívia, Síria, Sudão e Líbia. Como parceiros na abstenção, o Brasil contou com Angola, Benin, Butão, Equador, Guatemala, Marrocos, Nigéria e Zâmbia. A diplomacia brasileira preferiu também não se manifestar sobre outra moção, desta vez exigindo liberdade para os 2.100 presos políticos de Miamnar. Foi o único país do Mercosul a não endossar o documento.
Mianmar, aliás, é um dos 17 países que ganharam embaixadas brasileiras neste ano. Aliada à simpatia por ditaduras e regimes nada confiáveis, a abundância na criação de novas representações foi mais uma marca da diplomacia de Lula. Em oito anos, 62 embaixadas foram instaladas, muitas delas em lugares exóticos como Tuvalu, com menos de 13 mil habitantes, Butão, Samoa, Palau, Ilhas Fiji, Nauru e Névis, ou controversos, como Coréia do Norte. Muito menos polêmicas, outras quatro foram autorizadas por decreto: Afeganistão, Bielo-Rússia, Bósnia-Herzegovina e Estônia.
Quantidade não significa qualidade.
Boa parte das novas representações diplomáticas brasileiras foi fixada em Burkinas e Tuvalus, países sem qualquer importância no cenário mundial, e, muito menos, apelo econômico que justifique o investimento em um escritório formal. Uma equação em que muito se perde e nada se ganha. Multiplicam-se gastos, sinaliza-se erroneamente para os parceiros que interessam, criam-se rivalidades quase infantis com nações desenvolvidas e democracias sólidas. Dá-se voz e vez a regimes totalitários, conferindo legitimidade a quem não merece gestos de boa vontade, muito menos de um gigante como o Brasil.
A capitulação de Dilma já no primeiro embate assusta. Mas ela terá a chance de fazer valer a sua convicção de que apedrejamento é algo “bárbaro”, corrigindo, na primeira hora, pelo menos uma das muitas barbaridades da diplomacia do governo Lula. Do contrário, vai se render de vez. A essa e a outras barbáries.
Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa, @maryzaidan
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