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Maconha, legalizar ou reprimir?
A Comissão Global sobre Drogas encerra sua primeira reunião hoje, em Genebra, sob a coordenação do ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, com uma clara tendência, que certamente vai gerar muita polêmica: trabalhar pela legalização e regulamentação do uso da maconha como a melhor maneira de combater o tráfico de drogas e suas consequências.
Esse é um passo adiante do já dado pela Comissão Latino-Americana, que, além do ex-presidente brasileiro, tinha na sua coordenação os ex-presidentes César Gaviria, da Colômbia, e Ernesto Zedillo, do México, e defendeu a descriminalização da maconha, por ser a droga de uso amplamente majoritário no mundo (90% do consumo mundial de drogas) e, ao mesmo tempo, cujos malefícios podem ser comparados aos do álcool e do tabaco.
Fazem parte da Comissão Global políticos como Javier Solana, ex-secretário-geral da Otan e ex-Alto Representante para a Política Externa e de Segurança Comum da União Europeia; a ex-presidente da Suíça Ruth Dreifuss; George Schultz, ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos; e empresários como Richard Branson, fundador do grupo Virgin e ativista de causas sociais, e John Whitehead, banqueiro e presidente da fundação que construiu o memorial no lugar do World Trade Center, além de intelectuais como os escritores Carlos Fuentes, do México, e o peruano Mario Vargas Llosa, prêmio Nobel de Literatura.
A tese básica é que a política militarizada de combate ao tráfico tem sido muito custosa e, sobretudo, ineficaz, inclusive para os Estados Unidos, seu grande mentor, que gasta nela atualmente cerca de US$ 40 bilhões por ano.
Em 30 anos, o número de presos condenados por crimes relacionados com as drogas subiu de menos de 50 mil para 500 mil, representando um em cada quatro presos nos Estados Unidos. Enquanto isso, o preço das drogas está estabilizado ou decrescente, e o consumo não é reduzido.
Os estudos mostram que o tráfico de drogas também induz a outros tipos de crime. Segundo estatísticas, a média internacional de homicídios por cem mil habitantes mais que triplica em países produtores de drogas: de 5,98 em países não produtores de drogas, naqueles sobe para 17,05.
Os estudiosos reunidos em Genebra consideram que a política de “guerra às drogas”, além de inócua na redução do consumo ou da produção, teve impactos graves na sociedade, como o rápido aumento da população encarcerada no mundo, aumentando também a violação dos direitos humanos; a restrição ao acesso de remédios essenciais como morfina, efedrina e metadona; criminalização dos usuários, o que impede um trabalho de saúde pública mais efetivo, como a prevenção da Aids.
Um dos maiores especialistas na política de redução de danos, Alex Wodak, diretor do Serviço de Álcool e Drogas do Hospital São Vicente em Sidney, na Austrália — que ajudou a implantar naquele país o primeiro programa de seringas descartáveis e de injeções sob supervisão para viciados —, mostrou estudos que demonstram que a terapia de metadona para substituir drogas ajuda a reduzir crimes: para cada cem pessoas em tratamento de metadona durante um ano, houve uma redução de 12% de roubos; 57% de arrombamentos e 56% de roubos de veículos.
Uma análise independente do programa de seringas na Austrália verificou que, de 1988 a 2000, foram evitados 25 mil casos de infecção por HIV e 21 mil casos de hepatite C. Até o ano passado, o programa foi responsável por evitar 4.500 mortes por HIV e 90 por hepatite C.
Nesse mesmo período, o programa de seringas custou US$ 119 milhões e poupou dos cofres públicos um mínimo de US$ 2 bilhões (há cálculos que chegam a US$ 7 bilhões).
Para reforçar a tese de que a legalização e a regulamentação do uso da maconha podem trazer benefícios, seus defensores comparam a situação atual com a fase da “prohibition” (proibição), como ficou conhecida a Lei Seca dos Estados Unidos, aprovada em janeiro de 1919, e que proibia a produção, a venda e o consumo de bebidas alcoólicas.
Na reunião de Genebra, Mike Trace, presidente do Consórcio Internacional de Políticas sobre Drogas, que já comandou o combate às drogas na Inglaterra, apresentou um trabalho mostrando que a legalização poderia criar um sistema supervisionado e transparente de distribuição de drogas, que daria às autoridades um maior controle sobre o suprimento, a demanda e a circulação das drogas na sociedade.
Embora essa quebra de paradigma não tenha sido tentada em nenhum lugar do mundo — mesmo porque o país que tentasse teria que se afastar das convenções da ONU —, Mike Trace vê como um sinal de que essa política começa a ser levada a sério o forte apoio que a Emenda 19 na Califórnia recebeu, tendo sido derrotada por pequena margem no ano passado.
David Mansfield, um especialista em projetos de desenvolvimento em áreas dominadas pelo tráfico, tem trabalhado em várias das maiores regiões produtoras de drogas na Ásia e América Latina nos últimos 20 anos.
Nunca usei -- nem na adolescência -- mas sou a favor da legalização (para maiores de 18 anos).
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