Qual a pena adequada para um traficante de entorpecentes? A questão é polêmica, divide opiniões no Judiciário e no Executivo e pode voltar a ser examinada pelo Congresso Nacional. Há cinco anos, ao aprovar a Lei Antidrogas (Lei 11.343/06), a opção do Congresso foi por descriminalizar o consumo e aumentar o rigor contra os traficantes.
O artigo 44 dessa lei tornou os crimes de tráfico de drogas inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Vedou-se, inclusive, a conversão das penas de encarceramento em penas restritivas de direitos - as chamadas penas alternativas, que envolvem prestação pecuniária, perda de bens e valores, desempenho de serviços comunitários, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.
Até o ano passado, a Justiça dispensava tratamento processual igual para condutas diferentes no tráfico de entorpecentes. Tanto o condenado por vender um grama de droga quanto o que guardava cem quilos não recebiam o benefício da pena alternativa, capaz de evitar o encarceramento.
Mas a situação mudou: no início de 2010, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ampliou a interpretação do princípio da individualização das penas. A conclusão foi que simplesmente vedar a substituição das penas nos crimes de tráfico viola preceito constitucional.
Potencial ofensivo
Ao julgar um habeas corpus em setembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) seguiu o mesmo caminho: a lei comum não tem força de subtrair do juiz o poder de impor ao delinquente a sanção que julgar mais adequada.
O relator, ministro Ayres Britto, lembrou que a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, ratificada por vários países e incorporada ao Direito interno em 1991, prevê tratamento diferenciado ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize por seu menor potencial ofensivo.
Mas o que é potencial ofensivo? A interpretação fica a cargo de cada magistrado, já que o STF determinou ao juízo da execução penal que faça a avaliação das condições objetivas e subjetivas da substituição da pena, na situação concreta do preso.
A recomendação nem sempre é seguida pelas instâncias inferiores: os pequenos traficantes (também chamados de mulas) são vistos por muitos juízes como engrenagens essenciais da rede de tráfico de drogas e, por isso, não se beneficiam de penas alternativas.
Danos
A quantidade de entorpecente em poder do traficante nem sempre é suficiente para determinar o potencial ofensivo de sua ação. Por isso, o senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS) apresentou o projeto de lei (PLS) 187/09, que aumenta até o dobro a pena para quem traficar crack, a droga que, em sua opinião, é mais danosa à saúde dos dependentes. A proposta aguarda relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Outro critério para se avaliar o potencial ofensivo da ação do traficante pode ser encontrado no projeto de lei (PLS) 34/03, de autoria do senador Hélio Costa (PMDB-MG) e enviado à Câmara dos Deputados, onde tramita como PL 1827/07. A proposta aumenta de um terço ao dobro a pena para o tráfico de drogas praticado em estabelecimentos de ensino ou suas imediações.
O objetivo, conforme o autor, é desestimular a presença de traficantes em ambientes estudantis, que abrigam jovens em formação, "suscetíveis à perniciosa influência".
No governo, há controvérsias quanto a um eventual "abrandamento" da lei. A mais recente resultou na saída do secretário nacional de Políticas sobre Drogas, Pedro Abramovay, que se posicionou favoravelmente à aplicação de penas alternativas para pequenos traficantes, quando réus primários.
Proposta reintroduz detenção para quem consumir drogas
Um dos pilares da Lei Antidrogas (Lei 11.343/06), a descriminalização do consumo pode ter os dias contados, se for aprovado o PLS 111/10, do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o parlamentar quer a volta da punição para o usuário.
Mas ele observa que não pretende restringir à ótica da segurança pública uma questão que também é de saúde pública. Segundo Demóstenes, familiares, educadores e o próprio Poder Judiciário "ficaram de pés e mãos atados para internar o usuário".
- Se ele quiser se tratar, arruma-se uma clínica; se recusar o tratamento, nada se pode fazer além de assistir à autodestruição - afirma.
Erro
A parte visível da legislação, de acordo como senador, é a existência de esquinas, becos e quartos lotados de pessoas usando drogas sem que o poder público, a família e os amigos possam fazer alguma coisa além de torcer para que o Congresso Nacional "reconheça o erro e volte atrás na parte da lei que não funcionou".
A saída, conforme disse, é reinstituir a detenção de seis meses a um ano, com a possibilidade de substituição da pena por tratamento especializado. A decisão do juiz deverá basear-se em avaliação de comissão técnica composta por profissionais com experiência em dependência e efeitos das drogas.
Twitter
A idéia do projeto, como esclarece Demóstenes, surgiu na internet, enquanto debatia projetos com participantes da rede social Twitter. Para a formatação da proposta, ele diz que realizou audiências públicas virtuais no Twitter e recebeu sugestões por e-mail.
Djalba Lima / Agência Senado
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