domingo, 28 de agosto de 2011

Editorial = O Estado de S.Paulo - Uma lei que deu certo



Os resultados da aplicação da Lei de Recuperação de Empresas, que entrou em vigor em 2005, substituindo a Lei de Falências e Concordatas de 1945, surpreendem até seus mais ardorosos defensores. Apesar do número de falências ainda ser maior do que o de recuperações, o balanço mostra que a Lei de Recuperação das Empresas vem cumprindo seu papel de assegurar a continuidade dos negócios de empresas em dificuldades, preservando empregos.
A lei funcionou de maneira particularmente eficaz entre 2007 e 2008, durante a crise financeira que levou ao fechamento de bancos de investimento e comerciais, instituições hipotecárias e seguradoras, em todo o mundo. Em 2009, o número de recuperações bateu recorde no Brasil: foram 492 pedidos deferidos pela Justiça, segundo levantamento promovido pela Serasa Experian, a pedido do jornal Valor.
A Região Sudeste, onde funcionam varas especializadas em direito falimentar e uma câmara com desembargadores encarregados de julgar recursos impetrados contra as decisões de primeira instância, concentra o maior número de pedidos de recuperação. No Nordeste, só o Ceará criou varas especializadas em direito falimentar, mas a Lei de Recuperação de Empresas vem sendo cada vez mais aplicada na região por juízes de varas cíveis.
Apesar de ainda não haver registro de recuperação já concluída no Nordeste, há vários processos em andamento. Os juízes de vara cível podem não ter formação específica sobre o tema, que exige conhecimentos de direito, economia, finanças, administração e marketing. No entanto, têm a exata noção da importância da Lei de Recuperação de Empresas para a economia da região e, assim, vêm baseando suas decisões na jurisprudência firmada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
Editada quando o País ainda não havia se industrializado, a antiga Lei de Falências e Concordatas proporcionava poucas oportunidades para empresas em dificuldades sobreviverem.
Decretada a pedido de empresas já insolventes, a concordata permitia a continuidade de suas atividades em caráter precário, num processo que, a não ser nos raros casos em que o devedor contasse com o apoio de seus credores, só prolongava a agonia do empreendimento. Já a falência significava a destruição quase imediata de ativos e fechamento de postos de trabalho e eram comuns os casos de credores de importâncias relativamente pequenas que preferiam pedir na Justiça o encerramento do empreendimento a negociar o recebimento dos valores a que tinham direito.
Inspirada no direito comercial americano, a Lei de Recuperação de Empresas é mais adequada a um ambiente econômico moderno - entre outros motivos, porque oferece prazos mais flexíveis para o pagamento dos débitos das companhias em dificuldades financeiras. A lei inovou ao conceder à empresa insolvente a possibilidade de propor um plano de saneamento judicial, com prazo de duração de até 15 anos, criando uma alternativa para a concordata. Para os fornecedores de insumos e suprimentos, isso ajuda a preservar seus mercados.
Para os empregados, a recuperação torna possível, além da manutenção do emprego, o recebimento de salários atrasados. E, para as empresas, a recuperação lhes dá liberdade para cortar custos, fechar unidades improdutivas, desenvolver novos produtos e fortalecer as marcas mais conhecidas.
A trajetória da Lei de Recuperação de Empresas mostra como o País só tem a ganhar quando as lideranças políticas se revelam capazes de colocar o interesse público acima de seus interesses políticos.
O projeto foi preparado por Fernando Henrique Cardoso, em sua passagem pelo Ministério da Fazenda, e enviado ao Congresso em 1993, sofrendo na época oposição dos bancos e do PT. Mas, quando Lula ascendeu ao poder, seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci, se empenhou por sua aprovação, consciente de que a reforma da legislação falimentar era essencial para a estabilidade macroeconômica. Alguns juristas criticam pontos específicos da Lei de Recuperação das Empresas. Mas todos concordam que ela tem sido decisiva para que o Brasil possa continuar ampliando sua base produtiva.

Nenhum comentário:

Postar um comentário