sábado, 4 de dezembro de 2010

Oposição: conviente por omissão




Mara Kramer

Como brasileira, pura e simples, percebo, como muitos outros, que estamos vivendo em um país absorvido pelo caos. Um país onde o ufanismo do “estamos todos bem” convive com péssimos índices na educação, saúde, segurança pública, nos altíssimos valores da dívida interna, na mentira de que não existe uma dívida externa, na ausência de investimentos na infraestrutura, em um surgimento continuo de escândalos sobre corrupção nos organismos púbicos, cujo desfecho é a impunidade, no desejo do governo de turno de alcançar o monopólio institucional sem criticas. Estamos vivendo uma era onde o presidente da república torna-se cabo nas eleições e rasga a lei eleitoral, tem expediente de trabalho, não cumpre o que diz, e, diz uma coisa hoje e outra amanhã sem sofrer qualquer tipo de incomodo ético.



 A recém eleita presidente semana passada prometeu realizar um governo austero considerando a fabulosa dívida interna do país. Dias depois difunde a noticia da possível compra de um novo avião presidencial (no máximo 10 países no mundo o presidente tem avião próprio, a cumprir-se a nova compra, os ricos brasileiros teriam 2), assim como a possível contratação de dezenas de novos funcionários não concursados para o Palácio do Planalto, e a ampliação do número de ministérios que já são 37. 


O endividamento familiar e a explosão imobiliária já se tornam preocupantes, mas não parece inquietar o governo, sobretudo o presidente, que se mantém no palanque desde o primeiro dia e dali ainda não saiu com sua pregação diária, que não raro esta sob bases falsas. Jornais e jornalistas alinham-se, por interesses ou ideologia, mais pelo primeiro e menos pelo segundo, ao governo o apoiando em realizações ditas inéditas e redentoras do país, embora estas realizações não sejam nem originais, e muitas vezes não constituem de fato uma realização, sendo nada mais do que uma possibilidade de futuro. 


Por parte da imprensa observa-se a quase total ausência de critica, como se de fato “estivéssemos todos bem”, e todos os dados que negam esta “realidade” são desconsiderados no discurso posterior. Sem me prolongar, se estivéssemos “todos bem” não seria necessária a Operação Rio, pois questões sociais, urbanas, policiais e jurídicas em uma das maiores e mais ricas cidade do país estariam bem resolvidas. Ao contrario, vimos a intervenção militar em bairros do Rio como mostra cabal do fracasso das políticas sociais, infraestrutura urbana, e de segurança pública nesta cidade. Exemplo simbólico do que ocorre na grande maioria das cidades médias e grandes do país como todos sabemos.


 Enfim, estamos vivendo um total caos nas instituições públicas, liderado pela ineficiência, ausência de ética, e desejo de autoritarismo do governo central que infesta de incompetência e imoralidade por onde passa, pela irresponsabilidade do poder judiciário na exigência do cumprimento da lei, pela cooptação interessada de muitos meios de comunicação, e pela negligência da maior parte da oposição.


Deste momento em diante passo a refletir sobre o último item, entendendo que a oposição, a partir de seu silencio frente à má gestão do executivo e a ausência de comprometimento com a parcela da sociedade que representa se torna cúmplice deste despautério. Quando a oposição não cumpre sua tarefa de colocar limites na atuação governamental ela se torna conivente por omissão, e como efeito paralelo favorece o abuso de poder e a confiança na impunidade por parte da situação, assim como deixa sem voz o eleitorado opositor. Fazer oposição é um direito e um dever político na democracia, não uma opção partidária.


No sistema democrático é responsabilidade da oposição fiscalizar o governo institucionalizado em sua atuação frente à legislação vigente, a priorização das demandas e a vigilância dos interesses da sociedade, assim como defender as reivindicações do contingente opositor. Para tanto, a oposição deve ser constante, atenta, critica, e profissional. Deve denunciar abusos e incompetências, protestar publicamente, e agir com firmeza para impedir atos ilegítimos ou que lesem os interesses do povo.


O papel da oposição é igualmente relevante ao da situação, pois ambas representam parcelas da sociedade. A oposição é parte da democracia, sem a qual a democracia é imperfeita, perde qualidade. A democracia é o sistema político do, para e pelo povo, e, portanto toda sociedade deve estar representada ativamente no campo político, não apenas a maioria que vence as eleições. Quando a oposição falha, ela retira de seus eleitores o direito de terem voz no debate político. Portanto é fundamental no sistema democrático o equilíbrio de poder entre situação e oposição. A situação gestiona e realiza, e a oposição fiscaliza e limita através de sua presença e ações o poder institucionalizado. A ausência de equilíbrio entre ambas as forças, desestabiliza o sistema criando grandes ou pequenas anomalias prejudiciais ao seu funcionamento que terão conseqüências diretas ou indiretas na sociedade civil. O equilíbrio entre os discursos situacionistas e oposicionistas frente à opinião pública deve estar evidenciado e simbolizado na exposição na mídia. Ambos os lados devem receber atenção similar dos meios de comunicação na busca de promover equidade no debate, como base de informação e politização da sociedade civil, também fundamentos da democracia.


Nesta ótica, a oposição deixa de ser vitima de monopólio mediático, e do ufanismo criado pelo governo petista, para tornar-se um dos elementos que contribuem para a sua existência. A oposição que denuncia no período eleitoral é a mesma que calou antes, e não agiu para a alteração de rumos das políticas que ora critica. A oposição que apontou os erros da administração de turno na campanha eleitoral, é a mesma que se cala frente a possibilidade de restituição da CPMF, a possível aquisição pelo Estado do Aero Dilma, ao fracasso das políticas públicas na área da segurança que resultaram na Operação Rio, a ampliação de CCs pelo governo federal, ao salário mínimo de R$ 540,00, às criticas e desvalorização do TCU como órgão fiscalizador por parte do governo, a absolvição de Palocci, a qual cria antecedentes para uma situação similar em relação ao José Dirceu, etc 


Neste sentido, verificam-se dois aspectos: primeiro, a dimensão alcançada pela atitude passiva de nossa oposição, que a coloca como conivente com o setor ao qual deve opor-se, ou seja, agrega força e poder ao seu opositor. Situação totalmente contraditória sob o ponto de vista conceitual, com importante repercussão na realidade; em segundo lugar, este fenômeno não parece ser produzido pela cooptação da oposição pela situação, mas pela incapacidade e  inabilidade política, assim como pela ausência de uma estrutura adequada  de nossa oposição para enfrentar o poder constituído, o que segundo Reinaldo Azevedo, deve-se a uma leitura equivocada da realidade. 


Neste contexto, existe uma convicção inegociável, nosso interesse de manutenção da democracia, e com ela a oposição como um de seus fundamentos. Portanto, entendo que nossa tarefa como eleitorado opositor visa entender o comportamento da oposição e pressioná-la constante e firmemente para que ocupe o espaço que lhe pertence por dever e direito. Assim, não resta outra que elaborar e divulgar uma segunda parte deste texto. Aguarde!

no Twitter 

@MarKramer

Nenhum comentário:

Postar um comentário