DORA KRAMER - O Estado de S.Paulo
Uma sugestão singela para as excelências senatoriais que depois de amanhã fazem a primeira reunião da comissão que discutirá a reforma política: que tal ouvir o que pensam os eleitores a respeito, conhecer seus anseios e a partir daí estruturar um sistema de comunicação capaz de integrar representantes e representados num esforço conjunto de aperfeiçoamento?
Como? É ingênua a proposta? Não, apenas lógica. Como falamos de sistema representativo, é preciso levar em conta os dois lados da história, a fim de que não estejamos mais uma vez tratando de mudanças que interessam apenas a um deles.
O eleitor pode não entender, e a maioria não entende mesmo, os jargões da política. Mas sabe bem, ou ao menos intui, o que lhe desagrada.
Um obstáculo evidente nessa história é a desigualdade de condições: enquanto os políticos dominam muito bem o assunto, a sociedade nem sequer sabe o significado de determinados termos e conceitos.
Quantos conseguem dizer o que é voto distrital? Quem domina os cálculos do sistema proporcional? E a chamada "janela" de infidelidade partidária, as pessoas por acaso sabem que na prática isso altera por determinado período sua vontade expressa nas urnas?
Pelo seguinte: se, como se ventila agora, durante os últimos seis meses antes da próxima eleição o parlamentar puder ir para onde quiser estará subtraindo em seis meses o tempo de validade do voto dado à época da eleição, quando estava no partido.
E o voto obrigatório, alvo de críticas de todos os lados, mas justificado com o argumento de que o "brasileiro" não está suficientemente educado e politizado para o voto facultativo?
Por acaso alguém informa que dos 232 países do mundo apenas 24 adotam o voto obrigatório, sendo 13 deles na América Latina?
E assim a desinformação grassa também em relação a temas como escolha por lista fechada, financiamento público de campanha - já existente nas verbas do fundo partidário e no horário "gratuito" no rádio e na televisão - e a distorção federativa da representação da Câmara.
E o que seria esse ponto de nome tão pomposo? Simples: por obra do regime ditatorial, o general Ernesto Geisel promoveu uma mudança no critério de formação das bancadas, estabelecendo um mínimo (8) e um máximo (70) de deputados por Estado.
A ideia era fortalecer a representação de Estados mais dependentes do governo federal. Pois a ditadura acabou e hoje há Estados sub-representados e outros super-representados. Exemplo: São Paulo tem um deputado para cada 585 mil habitantes, enquanto em Roraima um parlamentar representa 51 mil cidadãos. Nos Estados Unidos a representação é alterada conforme a variação populacional.
E a diferença entre presidencialismo e parlamentarismo, o Brasil sabe qual é? No plebiscito de 1993 venceu a desinformação, porque se convenceu a Nação de que o parlamentarismo significa apenas que deputados mandam e desmandam no País.
Aquela parte sobre a efetiva corresponsabilidade com o bom andamento do governo que pode cair mediante voto de desconfiança foi relegada ao limbo do desconhecimento.
Assim vamos de novo entrando na discussão sobre reforma política em situação de desequilíbrio total: os políticos sabendo demais e a população sabendo de menos.
Se os especialistas no tema se dedicassem a esmiuçar cada ponto, tudo muito explicado, detalhado com prós e contras, o cidadão então bem informado poderia fazer suas escolhas, cobrar e se manifestar, com conhecimento de causa, sobre o que acha certo ou errado.
Utópica a sugestão? Não, apenas lógica, mas sem a menor chance de ser aceita pela óbvia evidência de que à ampla maioria do Congresso não interessa saber o que pensa a sociedade muito menos contribuir para a educação política do público. Pois sabemos como é: na falta de informação prevalece a manipulação.
Inspiração. Carlos Ayres Britto, ministro do Supremo Tribunal Federal: "O Rio de Janeiro é Deus com sua melhor roupa de sair".
Nenhum comentário:
Postar um comentário