A Petrobrás anunciou a intenção de investir US$ 224 bilhões até 2014 e confirmou mais uma ampliação de seu campo de atividade, novamente sem consultar a maioria dos acionistas. Até há pouco tempo a empresa se dedicava a negócios na área da energia e da petroquímica. A legislação sobre o pré-sal a encarregou de cuidar igualmente de política industrial.
Mas a estatal se envolve também, e cada vez mais, nos objetivos políticos e eleitorais do grupo comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele mesmo declarou, há poucas semanas, haver ordenado a construção de refinarias no Nordeste, contrariando a orientação técnica defendida pelos dirigentes do grupo. O novo plano de investimentos, coerente com a ordem presidencial, destina US$ 73,6 bilhões, 30% do total, ao segmento de refino, transporte e comercialização. No plano anterior, para o período entre 2009 e 2013, essa parcela correspondia a 24% do investimento previsto. Em contrapartida, o valor programado para exploração e produção diminuiu de 60% para 53% do total anunciado.
Com essa troca, a Petrobrás desloca recursos da atividade mais importante prevista para os próximos anos. A explicação, segundo o especialista Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), está na construção de refinarias. Até 2014, quatro novas unidades deverão entrar em operação pelo menos parcial no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Norte, em Pernambuco e no Maranhão - construídas por pressão dos governadores. A refinaria Premium, do Maranhão, é um "grande exemplo de como agradar a políticos", comentou o diretor do CBIE.
"Estamos nos concentrando em projetos que dão retorno de curto prazo e avaliando o que fazer com outros", disse o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli. Falta esclarecer quanto desse retorno é econômico e financeiro e quanto é medido em termos eleitorais. Pela intervenção cada vez mais escancarada nas decisões da estatal, o presidente Lula nem sequer procura disfarçar a subordinação da empresa a seus objetivos políticos.
Essa intervenção é bem anterior à temporada eleitoral de 2010. O presidente da República sujeitou a empresa também a suas pretensões de influência regional, usando-a para favorecer os parceiros bolivarianos e cubanos. Só isso explica sua atitude quando o presidente boliviano ocupou militarmente instalações da Petrobrás.
O presidente Lula e seus auxiliares não só aceitaram a violência, como a justificaram. Segundo eles, o gesto de Evo Morales foi um ato de soberania, como se a soberania dispensasse o respeito a contratos e a direitos negociados e reconhecidos livremente. A mesma concepção de política regional levou o presidente a pressionar a Petrobrás para se associar à venezuelana PDVSA, sem levar em conta as prioridades econômicas do grupo, os interesses dos acionistas minoritários - detentores, de fato, da maior parte do capital.
Em fevereiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou em seu programa semanal de rádio um retorno possível da Petrobrás à prospecção de petróleo em águas cubanas. Em maio, a companhia conseguiu um prazo adicional de seis meses do governo de Cuba para decidir se iniciará a exploração dos blocos negociados em 2008, durante visita do presidente aos irmãos Castro.
Por enquanto, o anunciado investimento de US$ 224 bilhões é um número vistoso, bem maior que a geração de caixa prevista para o período, de US$ 155 bilhões. Será preciso cobrir a diferença com dinheiro de nova capitalização, com empréstimos ou, mais provavelmente, com uma combinação dos dois tipos de recursos. Se as condições do mercado forem desfavoráveis, sempre se poderá refazer o plano, com cifras mais modestas e, talvez, com outras prioridades.
O plano tem objetivos claros. Mostra a empresa empenhada em crescer - embora com metas sujeitas a críticas de especialistas e investidores -, fortalece alianças para a campanha eleitoral e alimenta a lenda de um vigoroso e bem-sucedido Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), vinculado à imagem da candidata Dilma Rousseff. A Petrobrás tem realizado cerca de 90% dos investimentos previstos para as estatais e os teria realizado com ou sem PAC. Mas o governo precisa do mito, agora mais do que nunca.
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