- O Estado de S.Paulo
Na última segunda-feira, na sessão inaugural da 16.ª reunião ordinária do Conselho de Direitos Humanos da ONU, reunido no Palais des Nations, sede do organismo internacional em Genebra, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, fez uma clara tentativa de reverter os efeitos negativos do apoio dado pelo governo Lula a regimes autocráticos que violam os direitos humanos. Enfatizou a ministra que o Brasil defende a discussão de violações de direitos humanos "em todos os países" em que elas forem denunciadas.
No mesmo dia, também na Suíça, o chanceler iraniano, Ali Akbar Salehi, em entrevista ao Estado, declarou que seu país ficará "muito decepcionado" se o Brasil mudar seu voto em resoluções da ONU que condenam o regime de Teerã e fez um apelo para que isso não ocorra.
Na verdade, o governo Dilma já mudou a posição do Brasil em relação à violação de direitos humanos mundo afora, a começar pelo Irã. Antes mesmo de tomar posse, em entrevista à imprensa internacional, Dilma renegou tacitamente a política de seu antecessor ao condenar explicitamente a pena de morte por apedrejamento aplicada a mulheres condenadas pela justiça iraniana.
De qualquer modo, nas próximas semanas o Brasil terá outra oportunidade concreta de passar do discurso à ação, dirimindo de vez as dúvidas que ainda persistam na comunidade diplomática internacional, de modo especial em Washington, a respeito da posição do novo governo de Brasília nessa matéria.
De toda maneira, uma posição já ficou clara essa semana, quando a ONU excluiu a Líbia do Conselho de Direitos Humanos, como represália à violenta repressão do regime de Muamar Kadafi a seus opositores. Até o fim do mês o Conselho de Segurança deverá votar sobre pedido de investigação da situação dos direitos humanos no Irã.
Pelo padrão de comportamento do governo anterior, o Brasil, se não se manifestasse contra, pelo menos se absteria nessa votação. Agora, no caso da Líbia, o País acompanhou o voto de condenação ao regime ditatorial. A retificação da política, no caso iraniano, será a prova definitiva de que está sepultada a sistemática hostilidade aos governos democráticos do Ocidente que praticava o governo Lula.
Na reunião do Conselho de Direitos Humanos, a ministra Maria do Rosário foi protocolarmente cautelosa a respeito do voto brasileiro no Conselho de Segurança: "A presidente Dilma e o ministro Antonio Patriota tomarão a decisão no momento adequado, mas sempre de forma responsável". Mas foi menos cautelosa ao reafirmar "o compromisso de Dilma com a causa dos direitos humanos", avalizado por seu passado de militância na resistência à ditadura militar.
Observou, no entanto, que a luta pelos direitos humanos deve ocorrer efetivamente "em todos os países", sem "seletividade" ou "politização", numa clara crítica às potências ocidentais que fizeram vistas grossas à violação dos direitos humanos por parte de regimes autocráticos - como o do Egito - que apoiavam por razões estratégicas: "É necessário reconhecer que, por muitos anos, as alianças estratégicas mantiveram silêncio sobre violações aos direitos humanos. Essas situações estiveram ausentes das deliberações do Conselho".
A observação é correta, mas elide o fato de que o Brasil, durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também tinha o rabo preso nesse assunto, já que por razões "estratégicas" - no caso, o antiamericanismo e o terceiro-mundismo lulo-petista -, mais do que silenciar, apoiou explicitamente extravagâncias antidemocráticas de regimes como os de Havana, Teerã e Caracas.
De resto, inevitavelmente influenciados pelo rumo dos acontecimentos no Norte da África, os ventos que sopram na 16.ª reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU sugerem uma postura menos hipócrita de seus membros daqui para a frente.
A própria Alta Comissária do Conselho, a juíza sul-africana Navi Pillay, abriu o encontro do dia 28 enfatizando o fato de que esse organismo "não tem explorado ao máximo seu potencial" e instigando os seus membros a fazê-lo.
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