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Comissão que apura violação de sigilo de tucanos só cita ‘existência de conduta que, em tese, poderia configurar prática de crime comum’
Leandro Colon, de O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Depois de anunciar, na sexta-feira, 27, que tinha "indícios de um suposto balcão de compra e venda de informações" e "pagamento de propina" na delegacia de Mauá (SP), a Receita Federal excluiu essa versão do relatório entregue na segunda-feira, 30, ao Ministério Público com o indiciamento de duas funcionárias investigadas por violar o sigilo fiscal de quatro tucanos.
O Estado teve acesso ao documento e as palavras "propina", "venda", "balcão", "encomenda" não aparecem na representação criminal sobre o acesso ilegal aos dados.
Em apenas cinco páginas, a comissão que investiga o caso aponta apenas a "existência de conduta que, em tese, poderia configurar prática de crime comum pelas servidoras". A Receita informa que essa representação "não interfere no julgamento do mérito" e diz que ainda não há "convicção quanto à efetiva ocorrência de ilícito administrativo".
A corregedoria pede que o Ministério Público adote as "providências que entenda cabíveis" contra as servidoras Antônia Aparecida Rodrigues dos Santos Neves e Adeildda Ferreira dos Santos. Antônia é a dona da senha usada para acessar os dados no dia 8 de outubro de 2009. Adeildda é a responsável pelo computador utilizado para a consulta ilegal às informações fiscais do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, e de Luiz Carlos Mendonça de Barros, Ricardo Sérgio e Gregório Marin Preciado, ligados ao alto comando do PSDB. A ação é assinada por Levi Lopez, servidor que preside a comissão de inquérito. Segundo ele, a responsabilidade penal independe da apuração administrativa.
‘Encomenda externa’
O conteúdo da representação contradiz o discurso que a direção da Receita adotou na sexta-feira. O secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, e o corregedor-geral, Antonio Carlos Costa D’ Avila, afirmaram, numa entrevista coletiva convocada às pressas, que a investigação interna descobriu indícios de esquema de venda de dados fiscais mediante, segundo palavras deles, "encomenda externa" e "pagamento de propina". "Há indícios de uma intermediação feita por alguém de fora da Receita. Os indícios são de um suposto balcão de compra e venda de informação. Isso nós vamos repassar ao Ministério Público", disse o corregedor. De acordo com eles, as duas servidoras estariam envolvidas nesse esquema, o que elas negam.
A decisão do governo de indiciar as servidoras e divulgar uma versão de crime comum ocorreu após uma operação política do Palácio do Planalto na quinta-feira à noite. A estratégia era tentar despolitizar a violação fiscal dos tucanos e desvinculá-la da campanha presidencial de Dilma Rousseff (PT), para onde foi parar boa parte dessas informações dentro de um dossiê contra adversários.
"Nós não identificamos qualquer ilação político-partidária", fez questão de frisar o corregedor da Receita, cujo discurso foi reforçado pelo secretário Otacílio Cartaxo. Essa posição da Receita também contraria a condução do inquérito da Polícia Federal sobre o caso. Pelos depoimentos colhidos até agora, que apontam para um interesse político na violação das informações fiscais, a PF mantém a investigação que pode chegar à campanha petista.
Provas
A representação criminal contra as servidoras se resume a dizer que, por serem donas da senha e do computador utilizados, Antônia e Adeildda podem ter cometido crime por causa de "acessos sem comprovação de motivação". Na representação, a Receita enumera ainda as chamadas "provas materiais": uma folha de anotações, em que a senha de Antônia teria sido registrada, uma agenda, o disco rígido original do computador de Adeildda e mobiliários apreendidos. Todos esses materiais estão nas 450 páginas dos autos da investigação que também não citam o tal esquema de venda de dados fiscais.
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