Enquanto o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) desembolsa bilhões de reais para megaempreendimentos de infraestrutura e multinacionais, a indústria ainda sofre para ter acesso ao crédito com taxas mais baixas. As empresas reclamam das garantias exigidas e do excesso de burocracia para conseguir um empréstimo do banco estatal.
Pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) com 318 empresas mostra que 45% dos empresários deixam de investir por não terem recursos próprios suficientes para tirar um projeto do papel ou - para 37% - por não conseguirem acesso ao crédito do BNDES, repassado por outros bancos.
"O caixa se tornou a principal fonte de financiamento de muitas empresas brasileiras", observa o diretor do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, José Ricardo Roriz. Ele destaca que 74,6% dos investimentos previstos pela indústria neste ano deverão ser feitos com recursos próprios. Isso ocorre porque a taxa de juros dos bancos privados (e públicos) no mercado é muito alta.
Sem alternativa, as empresas buscam o BNDES, que tem o menor custo de financiamento do mercado. Mas nem todas têm sucesso, especialmente as de pequeno e médio portes. Na avaliação de Roriz, a instituição teve um papel fundamental durante a crise mundial, mas agora tem de mudar o foco. "É preciso atender empresas de menor porte que, ao contrário dos grandes conglomerados, não têm acesso ao mercado de capitais, mas têm grande importância para a economia nacional."
O BNDES contra-ataca com dados do primeiro semestre, que mostram avanço de 145% nas operações para pequenas e médias empresas, de R$ 6,8 bilhões para R$ 16,7 bilhões. Os números, no entanto, incluem todos os setores da economia e não apenas a indústria. Por outro lado, a instituição destaca que a maioria das operações voltadas para as médias empresas é feita por meio de outros bancos, que têm exigências específicas para conceder o crédito.
"A burocracia para conseguir um empréstimo do BNDES exclui as empresas menores, que não conseguem atender a todos os requisitos e desistem", afirma Manolo Miguez, presidente da Escovas Fidalga. Fundada em 1954, a empresa acaba de fazer um investimento em novo maquinário com capital próprio.
"Entramos em acordo com o fornecedor para parcelar a compra. Em um banco normal, a taxa de juros tornaria a operação inviável", diz Manolo. Enquanto isso, diz o executivo, o mercado brasileiro é atacado pela China, com produtos cada vez mais baratos. "Vamos até lá e vemos que não perdemos em nada para eles. Mas, quando o nosso produto sai da fábrica, ele deixa de ser competitivo", lamenta.
Manolo tem razão. Pelos cálculos da Fiesp, se os juros do Brasil fossem iguais aos dos concorrentes (Chile, Itália, Japão, Malásia e Noruega), o País teria disponível mais de R$ 58 bilhões para investimentos. Isso significaria ampliação de 38,3% do investimento industrial em 2010.
Cigarra e formiga. "A política do governo brasileiro beneficia mais a cigarra que a formiga. Hoje compensa mais deixar dinheiro no mercado financeiro do que investir em atividade produtiva", diz o presidente da Bitzer Compressores, Fernando Bueno. Recentemente, ele decidiu investir em equipamentos para modernizar a fábrica. Até procurou o BNDES, mas a burocracia inviabilizou a operação.
A exemplo de Manolo, ele também fez o investimento com recursos próprios e com a ajuda do fornecedor, que dividiu o pagamento em 12 vezes. "Se não tivesse dinheiro em caixa, não teria feito nenhum investimento." Bueno alerta para o rumo que a indústria brasileira vem seguindo nos últimos anos por causa do conjunto de "desincentivo" do governo. "A participação da indústria na economia era de 45%. Hoje está em 20%. Onde chegaremos?", questiona.
Opinião semelhante tem o presidente da Companhia Melhoramentos, Alfried Plöger, que vê uma desindustrialização no País. Além das dificuldades de financiamento, ele critica a elevada carga tributária, que tira das empresas um dinheiro que poderia ser investido em novas tecnologias e expansão da produção. O peso dos impostos também foi um item votado pelas indústrias como forte obstáculo aos investimentos.
Plöger afirma que, no último investimento da empresa, nem procurou o BNDES por causa da burocracia e das elevadas garantias. Conseguiu financiamento com os fornecedores no exterior. Ele alerta, porém, que esse tipo de situação precisa mudar. "O BNDES atende aos interesses do governo. Financia a Petrobrás, Belo Monte (hidrelétrica) e as obras do PAC. Sobra muito pouco para as empresas."
Na avaliação de Roriz, da Fiesp, o País precisa eliminar todos esses obstáculos se pretende manter taxa de crescimento sustentável acima de 5%. Segundo ele, apesar da retomada de vários projetos este ano, a taxa de investimentos não deve chegar a 19%, enquanto a média mundial é de 24%. Na China, diz ele, supera 40% e na Índia, 30%.
A taxa do Brasil é reflexo de vários fatores. Um deles é a baixa poupança do País, que mede a capacidade de uma nação investir e aumentar sua produção de bens e serviços, afirma o professor do Insper - Instituto de Ensino e Pesquisa, Marcelo Moura. Segundo ele, o inchaço do governo suga todas as fontes de financiamento.
Para ele, não existe milagre. "Não é possível crescer 7% ao ano com essa baixa taxa de investimentos. É preciso reduzir os gastos públicos agora." Outro erro, segundo Moura, é o BNDES elevar o volume de empréstimos com base em títulos do governo.
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