quinta-feira, 12 de maio de 2011

Editorial = O Estado de S.Paulo - Já viria tarde



- O Estado de S.Paulo
Termina no fim de semana o prazo que o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, considera necessário para que o governo da Argentina diga como vai resolver os problemas que tem causado à entrada de produtos brasileiros no país, com a imposição de diferentes restrições, cuja aplicação em muitos casos fere as regras do comércio internacional. Se, até lá, as restrições que prejudicam as exportações de centenas de produtos fabricados no Brasil não tiverem sido eliminadas, o governo diz que poderá adotar medidas de retaliação contra produtos argentinos destinados ao mercado brasileiro.
Caso decida aplicar tais medidas, o governo brasileiro estará apenas respondendo na mesma moeda ao tratamento dado pelo governo da presidente Cristina Kirchner aos produtos brasileiros vendidos para a Argentina - mas estará agindo com grande atraso, pois são antigas, crescentes e, quase sempre, irregulares as barreiras argentinas. Não há, porém, nenhuma garantia de que as autoridades de Brasília agirão com o rigor necessário para conter os excessos protecionistas do governo Kirchner.
Na área de comércio exterior, o governo brasileiro tem sido excessivamente tolerante com o argentino. Desrespeitando as regras da união aduaneira em que, pelo menos no papel, se transformou o Mercosul, o que implica a livre circulação de mercadorias entre os países que compõem o bloco, a Argentina eliminou as licenças automáticas para a entrada no país de uma lista de centenas de produtos, a maior parte dos quais o Brasil exporta para o país vizinho. Depois, estabeleceu uma espécie de preço mínimo para a entrada de outros produtos e criou taxas antidumping na entrada de outro conjunto de mercadorias. A empresa de consultoria econômica e de comércio exterior Abeceb, de Buenos Aires, calcula que 24% dos produtos brasileiros que entram na Argentina, ou praticamente um quarto do total, estão sujeitos a algum tipo de restrição.
É estranho que medidas desse tipo - aceitas pela Organização Mundial do Comércio (OMC), reconheça-se - sejam aplicadas não somente aos produtos originários de países de fora do Mercosul, mas também a mercadorias de países do próprio bloco comercial. Essas restrições enfraquecem ainda mais o já periclitante bloco comercial, que, por causa das muitas exceções às regras da união aduaneira, não justifica, na prática, essa condição. Mesmo assim, o governo brasileiro concordou com as restrições argentinas.
O caso fica ainda mais esquisito quando se observa que, não contente em descumprir as regras da união aduaneira, a Argentina deixa de obedecer também às normas da OMC. As regras internacionais determinam que as licenças não automáticas devem ser concedidas no prazo máximo de 60 dias, mas exportadores brasileiros se queixam de que seus produtos têm de aguardar até 180 dias para obter a autorização de entrada no mercado argentino. Por isso, filas de caminhões carregados com produtos brasileiros formam-se na fronteira, causando grande prejuízos para o exportador.
Em fevereiro, em Buenos Aires, o ministro Fernando Pimentel acertou com a ministra da Indústria da Argentina, Débora Giorgi, que, a partir daquele momento, a concessão da licença não automática para importação não excederia o prazo legal. Pelo visto, o acerto não está sendo respeitado. Pimentel informou que enviou cartas a sua colega argentina - conhecida pelo rigor com que trata a questão, alegando que há muitos anos o governo de seu país "tem sido excessivamente permissivo e frouxo com o Brasil" - pedindo providências para o cumprimento do que foi acertado há meses.
Os exportadores estão inquietos e se queixam do "grau de tolerância" do governo com relação às barreiras argentinas. O ministro do Desenvolvimento não se abala. "Queremos defender nossos exportadores", disse ao Estado. Mas ressalvou: "Queremos que a Argentina adote práticas condizentes com a relação que temos com eles, mas não podemos esquecer que o saldo positivo (do comércio bilateral) é para nós". Para concluir, afirmou: "Temos sempre que dar um crédito de confiança ao governo argentino". Será que ainda é possível que a resposta não venha? 


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