“A motivação é duvidosa e altamente perigosa. O atual sistema já é suficientemente pródigo e completo para realizar a fiscalização governamental nas três esferas federativas”
Marcelo Henrique Pereira* no Congresso em Foco
As iniciativas legislativas para a criação de novos Tribunais de Contas dos Municípios, notadamente na Paraíba (2008), e agora em evidência no Rio de Janeiro e em Tocantins, seguem motivação duvidosa e altamente perigosa. O atual sistema - existem 34 Cortes de Contas no Brasil - já é suficientemente pródigo e completo para realizar, por delegação constitucional expressa do Poder Legislativo, a fiscalização governamental nas três esferas federativas (União, Estados/Distrito Federal e municípios).
Nos Estados, os tribunais existentes encontram-se suficientemente organizados, aparelhados e desempenham funções adequadas ao controle das contas públicas, em âmbito estadual e municipal, sendo desnecessário, descabido, ineficiente e antieconômico propugnar pela criação de novos órgãos, em duplicidade com os existentes.
A introdução de novos órgãos de controle é medida que afronta diversos princípios jurídico-constitucionais e legais, como o da eficiência, o da economicidade e o da austeridade fiscal. Afinal de contas, com a tentativa de se criar outros órgãos, despesas permanentes (e crescentes) com o provimento, organização e atuação dos mesmos serão suportadas pelo cidadão-contribuinte e pela sociedade como um todo.
A cifra chegaria a milhões de reais. A título de exemplificação, sob o mesmo discurso, deputados estaduais promoveram no Rio de Janeiro a divisão da Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos do Estado (Asep-RJ) que gastou cerca de R$ 6,2 milhões só no primeiro ano. As duas novas agências, a Agetransp e a Agenersa, gastaram juntas cerca de R$ 9,2 milhões em 2006, dois anos depois. Já em 2009, a conta chegou a R$ 11,6 milhões. Imaginem se representantes de todos os 5.564 municípios do País fossem exigir a criação de Tribunais de Contas?
O correto seria investir, cada vez mais e permanentemente, no aperfeiçoamento dos atuais órgãos de controle, com melhor definição constitucional e legal de suas competências, atribuições e responsabilidades e a imprescindível valorização da atuação técnico-profissional das Cortes de Contas. Faz-se necessário, em especial, uma profunda reforma constitucional e legal, visando à estruturação de um verdadeiro Sistema Nacional de Controle Externo, com a unificação/uniformização da atuação destes órgãos.
O Legislativo, no entanto, vê-se às voltas com iniciativas desprovidas de espírito e interesse público e destoantes do quadro constitucional-legal em vigor. Tentam, a qualquer preço, alterar o sistema com visíveis prejuízos ao Estado brasileiro, aos cidadãos – notadamente os contribuintes – e à sociedade.
Na Paraíba, a tentativa de criação de novo Tribunal de Contas dos Municípios foi amplamente rechaçada por movimentos sociais e instituições organizadas, por meio de instrumentos jurídicos e judiciais, com o apoio da imprensa como formadora de opinião e o engajamento de entidades como os conselhos de classe (OAB, CRC, CRA, CREA, COREN, etc.), instituições (associações, sindicatos e federação) de servidores públicos, entre outros.
Situação que ora se repete, no caso do Rio de Janeiro e Tocantins, visto que a mobilização contra iniciativas deste porte, contrárias ao Estado Democrático-Constitucional de Direito, é sempre o melhor caminho para evitar impropriedades, ilegalidades ou inconstitucionalidades.
*Marcelo Henrique Pereira é presidente da Federação Nacional das Entidades de Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc
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