Fotos: Lula Marques, Alan Marques e Divulgação
Ex-presidente prega a ‘união’ contra o ‘pensamento único’
Diz que PT ‘se descolar da tradição democrática do Brasil’
Prevê oposição 'esmagada' e aliados feitos de ‘vassalos’
Atribui a Serra e Aécio papel de condutores das oposições
Compara sucessão à luta pelas diretas e o fim da ditadura
Fernando Henrique Cardoso não parece disposto a cumprir o papel de coadjuvante que seu partido, o PSDB, lhe atribui na eleição de 2010. Pela terceira vez consecutiva, FHC utiliza o artigo mensal que publica em vários jornais do país para atacar Lula, o PT e a candidata oficial Dilma Rousseff.
No texto levado às páginas neste domingo (4), FHC anota que, por trás dos dois candidatos que polarizam a sucessão –Dilma e José Serra—, “há um embate maior”. Acha que “está em jogo a própria concepção do que seja democracia”. Enxerga maus presságios nos movimentos de Lula.
Escreve que, tomado pelos “últimos 18 meses”, o governo Lula conduz o país a “um modelo de sociedade” deletério. Define assim a encrenca: “Predominância de uma forma de capitalismo na qual governo e algumas grandes corporações, especialmente públicas, unem-se sob a tutela de uma burocracia permeada por interesses corporativos e partidários”.
Anota que o programa concebido pelo PT para embalar a candidatura de Dilma “se descola da tradição democrática brasileira, para dizer o mínimo”. Acrescenta: “Cada vez mais nos aproximamos de uma forma de organização política inspirada em um capitalismo com forte influência burocrática e predomínio de um partido...”
“...Tudo sob uma liderança habilidosa [de Lula], que ajeita interesses contraditórios e camufla a reorganização política que se está esboçando”. À medida que se aproximam as eleições, diz FHC, “as alianças são feitas sem preocupação com a coerência político-ideológica: o que conta é ganhar as eleições”.
Depois, na eventualidade de um triunfo nas urnas, “a força do Executivo se encarregará de diluir eventuais resistências de governadores e parlamentares”. No dizer de FHC, o processo concebido por Lula, tocado pelo PT e encarnado por Dilma, prevê a conversão de aliados em “vassalos”.
“Mais recentemente”, escreveu o ex-presidente tucano, “tem surgido a dúvida”. Ele reproduz a interrogação: “Será que a candidata petista, sem ser Lula, terá força para arbitrar entre os interesses do partido, os dos aliados e os da sociedade?”
FHC, que no mês passado chamara Dilma de “boneca de ventríloquo”, responde: “Não sei avaliar”. Mas acrescenta, em letras peremptórias: “O resultado será o mesmo: pouco a pouco, o ‘pensamento único’, agora sim, esmagará os anseios dos que sustentam uma visão aberta da sociedade...”
Serão esmagados os que “...se opõem ao capitalismo de Estado controlado por forças partidárias quase únicas infiltradas na burocracia do Estado”. FHC compara o projeto econômico que supõe esconder-se atrás de Dilma ao modelo adotado pela China –combinação de abertura econômica e ditadura política.
Leia-se FHC: “Há quem acredite que certo autoritarismo burocrático com poder econômico-financeiro pode favorecer o crescimento econômico. A China está aí para demonstrar que isso é possível. Mas é isso o que queremos para nós?”
FHC deita sobre o papel uma segunda interrogação, dirigida aos aliados do tucano José Serra: “Os líderes oposicionistas atuais terão a visão de grandeza dos que os antecederam e perceberão que está em jogo a própria concepção do que seja democracia?
FHC acusa Lula: “A força governista ignora os limites da lei e tudo que decorre dessa atitude, desde a leniência com a corrupção até a arrogância do poder e o abuso publicitário antes do início legal das campanhas”.
Daí o “imperativo” de que “as oposições se unam”. A julgar pelo teor do texto, FHC considera que a união precisa começar em casa. Prega a “aliança entre Minas e São Paulo”. Leia-se Aécio Neves e José Serra.
Até bem pouco, FHC defendia que Aécio fosse o vice de Serra. Agora, escreve que a parceria entre os dois “pode se dar de forma variada”. A menção a Aécio foi antecedida de um toque emocional.
Na abertura do artigo, FHC recorda a luta pelas diretas e pelo fim do autoritarismo. Diz que, derrotada a emenda que restituía o voto direito, “a condução do processo” foi ao colo de três personagens: Ulysses Guimarães, Franco Montoro e Tancredo Neves, o avô de Aécio.
Reconhece que Ulysses, Montoro e Tancredo “não foram os únicos” a suar a camisa. “Muita gente se empenhou desde a campanha das Diretas Já [...]. Nem se deve esquecer o papel desempenhado pelas grandes greves do ABC e por seus líderes”. Esquiva-se de citar o nome de Lula, o grande líder do ABC.
Lembra que “foi difícil” para Ulysses aceitar a via indireta do Colégio Eleitoral. Difícil também aceitar a avaliação de Montoro de que o figurino de candidato ajustava-se mais ao manequim de Tancredo Neves.
Rememora: “Ou nos uníamos e ampliávamos a frente contra o autoritarismo ou este permaneceria por mais tempo, esmaecido que fosse, com a eleição de Paulo Maluf, candidato da Arena...”
“...A visão de futuro e o interesse nacional contavam mais do que as biografias. Tiveram grandeza. São Paulo se uniu a Minas para que o Brasil avançasse e Ulysses chefiou a campanha pela eleição de Tancredo”.
No último parágrafo do artigo, FHC amarra passado e presente: “José Serra e Aécio Neves estiveram ao lado dos que permitiram derrotar o regime autoritário. Cabe-lhes agora conduzir-nos para uma vitória que nos dê esperança de dias melhores. Tenho certeza de que não nos decepcionarão”.
O ex-presidente talvez não tenha se dado conta, mas o apelo à união de Minas e São Paulo revela que a propalada disposição de Aécio de arregaçar as mangas por Serra está longe de ser um dado da realidade.
Leia mais no Blog do Josias de Souza
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário