–1. O jornal Folha de S.Paulo, em matéria do colunista Fernando de Barros e Silva, mostra um forte dissenso entre os ministros Cezar Peluso, atual presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e o predecessor Gilmar Mendes.
Motivo do dissenso que o ministro Mendes disse que levará à mídia e que vazou ao jornalista Fernando de Barros e Silva: valores gastos (R$4.036.314,90) com passagens e diárias, referentes ao programa Mutirão Carcerário, por juízes convocados para auxiliar a presidência do órgão e referente ao programa.
A troca ríspida de e.mails, — cujo teor foi divulgado em furo jornalístico pelo jornal Folha de S.Paulo–, mostra estar Peluso inconformado, — com razão evidente–, em face o valor dos gastos “ que não correspondem exatamente ao total despendido de fato”.
Para o ministro Peluso, que teve uma carreira na Justiça de S.Paulo, marcada, além da competência e o profundo conhecimento do Direito, pela correção e nenhuma condescendência com ilícitos, o CNJ não contava com “setor contábil específico e nem controle individualizado de custos e por projeto ou programa, com subcontas próprias”.
O dissenso, consoante mostrado na matéria do colunista Fernando de Barros e Silva, iniciou-se com o repasse de informação, para Gilmar Mendes, de uma reunião do CNJ, presentes 14 conselheiros, na qual Peluso criticou os gastos do programa.
Ao assumir a presidência, Peluso dispensou os juízes auxiliares convocados na administração Mendes, para auxiliá-lo. Como se percebe, Mendes aparelhou de juízes a sua presidência, num Conselho que tem por meta o “controle externo” das atividades administrativas de Tribunais (com exceção do Supremo Tribunal Federal) e de magistrados.
–2. Nada surpreende. O ex-ministro Marcio Thomaz Bastos vangloriou-se de ter logrado implantar um órgão de controle externo de juízes e tribunais. Nada mais enganoso, conceitualmente.
Controle externo, com maioria dos controladores juízes e sem participação popular direta (escolha por votação entre os cidadãos) é, evidentemente, uma contradição: art.103-B, da Constituição federal, sobre a formação e escolha dos 15 membros do CNJ:
“- um ministro do Supremo Tribunal Federal, indicado pelo respectivo tribunal.
- um ministro do Superior Tribuanl de Justiça, indicado pelo respectivo tribunal.
- um desembargador de Tribunal de Justiça, indicado pelo Supremo Tribunal Federal.
- um juiz estadual indicado pelo Supremo Tribunal Federal.
- um juiz do Tribunal Regional federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça.
- um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça.
- um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho.
- um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho.
- um membro do Ministério Público da União. . .
- um membro do Ministério Público estadual. . .
- dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados.
- dois cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada indicados, um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.
Certa vez, no programa Roda Viva da televisão Cultura, fui convidado para participar de uma bancada de entrevistadores do então ministro Bastos. Quando questionei sobre a composição corporativa e sem representação popular por escola direta dos dois representantes, a reposta surpreendeu: “foi o que se conseguiu”. Ou seja, não fosse assim, não se conseguiria aprovar uma emenda constitucional.
Sobre não ter o CNJ poder fiscalizador junto ao STF, colocou-se, para tanto, o órgão, na topografia constitucional, abaixo do referido STF. Em outras palavras, tornou-se hierarquicamente inferior.
–3. Como alertou Peluso, os juízes auxiliares (convocados para ajudar e a desfalcar as Justiças de onde tirados), fora as passagens, ganharamR$2.807.055,70.
Não dá para acreditar que juiz convocado, sem perda da remuneração originária, ainda embolse diárias. Ou seja, uma “grana extra” por estar fora do lugar original das suas funções. Será que o convocado não sabia que precisava se deslocar ?
–4. No tal mutirão carcerário, — e o ministro Mendes fala na soltura de 20 mil encarcerados–, ficou evidente que o CNJ, com delegação a juízes auxiliares, decidiu sobre matéria jurisdicional : soltura e progressão de regime penitenciário, matéria eminentemente jurisdicional. Assim, decidiu sem competência. Aliás, como ocorreu na decisão liminar lançada por Mendes e a soltar o banqueiro Daniel Dantas. O ministro Gilmar Mendes não tinha competência jurisdicional, mas soltou.
–5. PANO RÁPIDO. Volta a repetir o escritor gaúcho Mario Quintana, certa vez lembrado pelo comentarista decano deste blog, Paulo Carvalho: “A Justiça é cega, isso explica muita coisa”.
Por Wálter Fanganiello Maierovitch n o Terra Magazine
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