Pedro Barbosa Pereira Neto. Procurador Regional Eleitoral de São Paulo
"Quando a Justiça sinaliza que funciona mal, ela está dizendo para o político de bem que não vale a pena ser do bem", adverte Pedro Barbosa Pereira Neto, novo procurador regional eleitoral de São Paulo. Ele aponta um "conjunto de fatores" que, em sua avaliação, maculam o processo eleitoral ? fichas sujas, multas pífias (inclusive para quem faz propaganda antecipada), legislação casuística, caixa 2, corrupção, interpretações liberais nos tribunais, impunidade, desigualdade social, miséria. Votos por tijolos.
O desafio que o espera não é simples. Pereira Neto terá a missão de conduzir a atuação do Ministério Público nas próximas eleições em todo o Estado, maior colégio do País ? 30 milhões de eleitores que, em outubro, elegerão 94 deputados estaduais, 70 federais da bancada paulista na Câmara, 2 senadores, governador e presidente.
Eleito por seus pares para mandato de dois anos, ele toma posse no dia 8. Aos 45 anos, há 15 é procurador da República, sempre dedicado ao combate a fraudes contra a União. Nessa função, conduziu investigações importantes ? em 2005, ele obteve judicialmente a prisão do ex-prefeito Paulo Maluf (PP-SP), a quem acusou de lavagem de dinheiro. Apurar denúncias de abusos de políticos já faz parte do seu dia a dia. Desde 2006, atua na área eleitoral do Ministério Público.
Qual a sua maior preocupação?
É a falta de efetiva punição àqueles que violam a lei eleitoral. Basta examinar as estatísticas das cortes eleitorais. Vamos verificar que o nível de condenação é muito baixo. São poucas as cassações de registro, uma punição mais efetiva a quem se desvia do rumo certo do processo eleitoral. A primeira deficiência do sistema é a própria legislação eleitoral, muito casuística. Muda ao sabor das eleições.
Pode dizer que não vai ter caixa 2 na eleição?
Como cidadão e como procurador eleitoral eu não prometo. Acho que é impossível. Isso precisa ser fiscalizado, mas os casos precisam chegar ao Ministério Público Eleitoral, que está aberto para receber denúncias e notícias de irregularidades. A desigualdade social é terrível e cria situações de vulnerabilidade, inclusive para o processo eleitoral. Nas regiões mais pobres do País, o processo eleitoral é extremamente conturbado, com oferecimento de pequenas vantagens, desde tijolo até quitação de IPTU atrasado. Essa vulnerabilidade social contribui muito, e de forma efetiva, para a corrupção eleitoral.
A Justiça não condena?
A Justiça eleitoral tem que ser rigorosa na punição da corrupção, da captação de sufrágio e de recursos para financiamento ilegal de campanhas. Não pode ser apenas a Justiça da urna eletrônica. Ela tem que atuar também como uma Justiça que efetivamente faz cumprir o controle da probidade, da normalidade, da legitimidade e da moralidade do processo eleitoral. Tem que impedir que o processo democrático seja deturpado já nas campanhas. De outro lado, se o País tem menos miseráveis, o processo político tende a melhorar. É muito difícil falar em voto consciente para um cidadão que está passando fome. A pobreza é refém da corrupção eleitoral. Inacreditável que nos deparemos com situações como compra de voto a R$ 30.
Juízes dizem que faltam provas para condenar.
Predomina visão muito liberal do sistema eleitoral. Temos um país onde o público e o privado se confundem. Há casos em que o conjunto probatório é fraco. E há casos em que a prova é suficiente, mas não há condenação. Um aspecto subjetivo na interpretação de provas. O volume de cassações é baixo. Há um déficit de punição.
O presidente Lula foi multado quatro vezes por campanha eleitoral antecipada. De que adianta?Nesse caso particular, a lei mostra que não tem força alguma para segurar a ilicitude eleitoral. O mesmo vale para a propaganda partidária desvirtuada, onde um candidato se utiliza de um programa partidário para fazer campanha eleitoral.
Prisão para infratores?
Não digo prisão, mas no momento em que a Justiça Eleitoral sinalizar que um abuso pode gerar a cassação do registro e a cassação do diploma, que são as sanções mais importantes do processo eleitoral, aí de fato esse quadro pode mudar. Quando a Justiça sinaliza que funciona mal, ela está dizendo para o político de bem que não vale a pena ser do bem. Porque, se um concorrente, numa determinada eleição, praticou ilegalidades, comprou votos, fez financiamento ilegal de campanha, propaganda antecipada e outros atos ilícitos e a Justiça não consegue efetivar a norma legal e não pune, aquele candidato que andou na linha, sem dúvida nenhuma na próxima eleição vai fazer exatamente o que fez o seu oponente criminoso. A impunidade no sistema eleitoral é extremamente grave.
Quando a regra dos fichas sujas deve valer?
Já. A vida pregressa, como requisito de inelegibilidade de um político, está na Constituição desde 1993 a fim de proteger a probidade administrativa. O princípio da presunção da inocência tem aplicação em aspectos ligados ao direito penal. A lei contra fichas sujas não tem finalidade casuística. Política não pode ser coisa de gente com ficha suja.
Como vê a mídia nas eleições?
A lei não impõe mutismo absoluto no ano eleitoral. As pessoas podem se manifestar. Uma coisa é candidato proibido de por outdoor na rua. Outra é alguém dar entrevista e falar bem ou mal de um candidato. Está dentro da liberdade de manifestação e da liberdade da mídia. O veículo de comunicação pode ter sua linha editorial e abrir espaço para quem critica ou elogia esse ou aquele candidato. É o processo democrático.
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